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Loro, Lôôro

Até onde sei|Octavio Tostes

“Papagaios são muito mais que pássaros bonitos”, dizia a manchete do “The York Times” na newsletter do “Nexo”, jornal eletrônico de análises e links. Não só falam como possuem dialetos que os jovens aprendem mais depressa que os idosos. Vivem 50 anos, uns chegam aos 90 e um passou dos 100. Primos distantes dos falcões, são predadores também, mas de sementes. Seus bicos poderosos caçam, nos grãos, proteínas e gorduras que as plantas reservam para o embrião de árvores futuras.

Sempre me impressionei com papagaios. Coloridos, nariz-bico, olhos intrigantes. Desengonçados no chão, cortantes no ar. Inteligentes. Ler a matéria sobre as descobertas de pesquisadores da Áustria à Austrália, da Indonésia aos Estados Unidos, foi como se a ciência confirmasse o que a sabedoria popular sugere faz tempo: eta bicho danado. E as piadas em que roubam a cena, atrevidos, desbocados, surpreendentes?

Terra dos Papagaios foi um dos nomes do nosso país logo depois de Cabral, aprendi no excelente “Brasil: uma biografia” das historiadoras Lilia Schwarcz e Heloisa Starling. Comecei o livro de trás pra frente. Primeiro as heranças da ditadura militar. No recuo até Getúlio, reli que desde os anos 50 do século passado a sociedade brasileira se divide entre dois projetos de modernização, um nacionalista e outro de associação ao capital internacional. Em 54 e 64, o nacionalista perdeu. Agora, vivemos novo embate.

Voltando aos papagaios, símbolo da nova terra nos mapas antigos e personagem dos relatos de viajantes, lembra do Zé Carioca? Mais um retrato estrangeiro do Brasil. Criado pelo Walt Disney do Mickey nos anos 40 do Estado Novo de Vargas. Os Estados Unidos em guerra, os estúdios quase falidos e o presidente Roosevelt, em busca de apoio dos vizinhos do sul, patrocinou a viagem de uma equipe de animação a estes cantos. Zé Carioca nasceu no Copacabana Palace, com as feições do compositor Herivelto Martins e o caráter das piadas: malandro, alegre, bom de bola e de samba, esperto e meio preguiçoso. “Um papagaio na periferia do capitalismo” na expressão citada pelas autoras.

De 2013 para cá, nas redes sociais, nas ruas e nas manchetes, os papagaios andam ensandecidos. Palram sem nexo. Na assembléia histórica deste abril, na cumbuca aberta do planalto central, houve até elogio da tortura e duelo de cuspe. Depois do alarido, o Brasil chocado, emudeceram. Uns de tristeza. Outros talvez de uma vergonha que não costumam ter na cara. E da macega do cerrado ergueu-se um silêncio espesso que fez a todos perdedores.

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