Queca e lamparina: receitas de origem europeia que viraram quitandas mineiras
Nossa equipe experimentou o doce nova-limense que pega fogo, literalmente!
Quitandas e Quitandeiras|Do R7 e Mayara Folco
Partiu Nova Lima? Pertinho de BH, dá pra chegar lá em apenas 20 minutos, se o trânsito estiver bom. A cidade, com mais de três séculos, é cheia de atrativos turísticos. A paisagem exuberante guarda preciosidades, como o Parque Nacional da Serra da Gandarela e o Parque Estadual da Serra do Rola Moça.
A riqueza escondida no solo de Nova Lima atraiu a atenção dos ingleses. Eles chegaram por volta de 1820, quando uma companhia inglesa comprou uma mina para a exploração do ouro. É só andar pela cidade para perceber que a influência britânica está por toda parte.
O famoso bicame, por exemplo, é um canal que foi construído para conduzir a água até a Mina de Morro Velho, para lavar o ouro. No bairro Quintas, algumas casas que abrigavam os imigrantes mantêm o estilo europeu até hoje. É bonito de se ver! Era nesta região que os ingleses viviam no século XIX.
Nós gravamos este episódio do “Quitandas e Quitandeiras” na Casa Aristides. Lá funcionava um armazém, muito frequentado pelos funcionários da companhia inglesa de que explorava ouro em Nova Lima.
Foi no antigo empório que conhecemos a história de duas quitandas típicas da região: a lamparina e a queca. Duas delícias que chegaram a cidade com os europeus e foram registradas como patrimônio imaterial do município, anos mais tarde.
Mas, afinal, o que é um patrimônio imaterial? Quem me explicou o conceito foi a gerente de patrimônio do Instituto Estadual do Patrimônio Histórico e Artístico de Minas Gerais, Nicole Faria Batista.
Segundo ela, são bens intangíveis. “Transmitidos de geração a geração, que tem uma continuidade no tempo. Há transmissão do conhecimento entre os pares, as famílias, as comunidades e que formam a identidade, a história e a memória de um povo”.
Depois que o bem é registrado como patrimônio imaterial, o município precisa criar ações que garantam a conservação e a transmissão de tudo que o envolve para as gerações futuras. A ideia é que esse saber não seja perdido no tempo.
O bolo que comemos é tão bem decorado que parece cravejado de pedras preciosas. O nome original é christmas cake, que em inglês significa bolo de Natal. Como bons mineiros que somos, nós juntamos as palavras e virou QUECA. Bem mais fácil, né?!
A receita leva muitas especiarias e ingredientes necessários para conservar a quitanda por mais tempo, afinal naquela época não existia geladeira. Eles usavam limão, cravo, bicarbonato e conhaque. A mistura garante a conservação da queca por até três meses, sem refrigeração.
A outra delícia é a lamparina, o nome é perfeito para o quitute! A semelhança entre o doce e o objeto usado para iluminar ambientes é real. A receita da lamparina foi criada pelos donos de uma hospedaria na época em que Dom Pedro Segundo e a imperatriz Dona Tereza Cristina visitaram Nova Lima.
A quitandeira e empresária Helena Bastos explicou que a cozinheira da hospedaria usou o óleo de coco como combustível, colocou um pavio e virou realmente uma velinha em cima do docinho.
A lamparina lembra o pastel de Belém, mas o recheio foi adaptado com coco, manteiga e ovo. Eu comi e amei! Fiquei encantada, igual criança, quando o pavio ascendeu. Viajei no tempo, imaginando a cena: uma mesa cheia de lamparinas brilhantes e comestíveis. O banquete original deve ter sido incrível!!
Sejam tradicionalmente brasileiras ou influenciadas por outras culturas, as quitandas mineiras, além de deliciosas, são recheadas de história.
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