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Se eu fosse eu
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Exagerada, com mil rosas roubadas, adorava um amor inventado 

Clarice é Cazuza. Cazuza é Clarice. Os dois misturados, com segredos de liquidificador.

Se eu fosse eu|Do R7; Renata Chiarantano; Carmen Farão; @seeufosseeu


Cazuza nasceu em 1958, viveu a adolescência em 1970, época efervescente da Literatura e movimentos contraculturais.

“Eu queria anunciar aqui o seguinte: a pessoa que eu mais amo na minha vida chama-se Clarice Lispector.” Já um pouco cambaleado por causa da bebida, Cazuza se declarou durante um show, no Rio de Janeiro, em 1988. Logo em seguida, o artista disse à plateia que queria cantar uma “poesia” de Clarice que havia musicado. A poesia era, na verdade, um trecho de Água Viva, de 1973, adaptado para se tornar letra da canção “Que o Deus venha”. No confessionário Lispectoriano, Cazuza admitiu ter lido Água Viva mais de CEM vezes. Um exagerado agora diagnosticado. Água Viva é, sem dúvida, um dos livros da autora mais complexos e profundos. Pode ter sido ali que o jovem e inquieto Cazuza encontrou uma idelogia pra viver: arrebatado por Clarice, num caminho sem volta.

Frejat falou que Cazuza deu o esboço da música “Que o Deus venha” para ele fazer ajustes. Cazuza provocou surpresa ao explicar que era um texto dela, e não dele: “Não dava pra imaginar que era um texto de Clarice, de tão parecida que a letra estava com o jeito dele escrever”.

Misturados e cheios de segredos de liquidificador, vale citar o trecho original:

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“Sou inquieta, áspera e desesperançada. Embora amor dentro de mim eu tenha. Só que eu não sei usar amor. Às vezes me arranha como se fossem farpas. Se tanto amor dentro de mim recebi e no entanto eu continuo inquieta, é porque eu preciso que o Deus venha. Venha antes que seja tarde demais. Corro perigo como toda pessoa que vive e a única coisa que me espera é exatamente o inesperado. Mas eu sei que vou ter paz antes da morte e que experimentarei um dia o delicado da vida. Perceberei — assim como se come e se vive o gosto da comida”.

Ser teu pão, ser tua comida, todo amor que houver nessa vida. Era amor exagerado mesmo, desses que fazem o mundo inteiro acordar e só ele dormir, depois de passar a noite com Clarice.

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Os dois, com a sorte desse amor tranquilo.

Oitenta e oito era mesmo o ano de Cazuza reverberar Clarice. Em entrevista à jornalista Marília Gabriela, no programa Cara a Cara, o cantor revelou que o livro A Descoberta do Mundo, com crônicas de Clarice para o Jornal do Brasil, era a “Bíblia” de cabeceira dele.

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Nos 32 anos de vida breve, Cazuza se orgulhou e se embebedou de frases e textos da escritora, que também morreu jovem, aos 57. Cazuza dava bandeira e mostrava tua cara: era um Clariceano assumido.

Se estivesse vivo… Se eu fosse eu, exagerava, reinventaria Clarisse com dois S.

Foram mil rosas roubadas do conto que ele respirou: “Cem Anos de Perdão”, em que a menina rouba rosas com orgulho e pudor.

As mentiras sinceras de Clarice viraram dogma na vida dele. E refrão de música estourada. Exagerada. Não tem como Clarice não te notar, Cazuza.

Você fez tudo por ela. Mendigou, roubou e matou versos em legítima defesa. Vai ver os destinos estavam mesmo traçados na maternidade. E o futuro repetiu o passado. Dois exagerados. O exagero de sentimentos e sensações que transbordam, dias sim, dias não.

Vidas breves, Vidas loucas. Vida.

Memes, declarações, citações, diversão e reflexão no Insta e no Facebook: @seeufosseeu

Os textos aqui publicados não refletem necessariamente a opinião do Grupo Record.

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