Cantores viram empresários e lucram em outras atividades
Sorocaba, Anitta e Daniel focaram investimentos além da música
Música|Helder Maldonado, do R7

A crise da pirataria e a digitalização do consumo de música modificou completamente o funcionamento do mercado fonográfico e de shows. Se antes o artista tinha a cômoda vantagem de se preocupar apenas com o lado criativo, desde o início do século que as coisas não são mais assim.
Sem grandes gravadoras por trás, os artistas precisaram se adaptar e expandir suas atuações. Quem entendeu que música não se faz apenas em estúdio e nos palcos, saiu na frente nesse novo cenário.
Não à toa, grandes nomes do sertanejo e do funk também são sócios ou donos dos escritórios que gerenciam suas carreiras. O que antes era exceção, agora virou cena comum. Questões administrativas, de logística, divulgação e até mesmo investimento em novos nomes da música nacional agora integram a rotina de um cantor.
Um dos mais bem-sucedidos exemplos é Anitta, que viu sua carreira e cachê decolar logo após romper a parceria que mantinha com a empresária Kamilla Fialho. Apesar das pendências judiciais que isso gerou e da multa milionária que a popstar precisou pagar, centralizar todos aspectos da carreira em um escritório próprio foi uma decisão acertada. E agora, ela quer ir além e começar a contratar novos artistas. A primeira aposta foi Micael Borges.
A segunda seria Pabllo Vittar, mas a drag queen preferiu fechar com outra cantora-empresária: Preta Gil. A cantora, que muitas vezes é alvo de piadas irônicas sobre não ter uma profissão, é na verdade uma das agitadoras culturais mais requisitadas do Rio de Janeiro.
Muito além do trabalho de cantora, foi ela que ajudou a estruturar as festas-shows, muito populares no segmento LGBT, com o projeto Noite Preta. No Carnaval carioca, o Bloco da Preta já é um dos principais eventos do calendário e atraiu neste ano 300 mil foliões.
Para Sorocaba, da dupla com Fernando, pensar a carreira como uma empresa é essencial para os dias atuais. Ele diz que não é recomendável apostar apenas em um aspecto e ignorar a parte administrativa e financeira.
— Desde que comecei a cantar, sempre vi como um negócio e fiz o planejamento com uma empresa. Por exemplo, investi uma parte do dinheiro que ganhei cantando em festas universitárias e churrascos de amigos para comprar meus próprios equipamentos de show. Com o passar do tempo, fui aprendendo a gerenciar minha própria carreira e novos negócios.

Segundo o músico, à frente de do escritório FS Produções, hoje parte do que ganha com música já se transformou em negócios no ramo alimentício, agropecuário e até farmacêutico.
— Um bom empreendedor tem que ter conhecimentos dos seus negócios. Por isso, meus principais investimentos estão no ramo da música e do entretenimento. Minha veia empreendedora, porém, me fez aventurar-se por outras áreas. Hoje tenho um leque de investimentos diversificado.
Novidade apenas no Brasil
Sorocaba, Anitta, Preta Gil, Ivete Sangalo, Claudia Leitte, entre outros, inauguraram a era dos artistas empresários no Brasil. Mas essa ideia não é novidade no exterior.
Gene Simmons, do Kiss, e Mick Jagger, dos Rolling Stones, sempre tiveram à frente de suas bandas-empresas como verdadeiros CEOs de multinacional. Diferente de outros contemporâneos, eles estavam na vanguarda e sabiam que rock era um negócio lucrativo em várias frentes.
Por aqui, Ivete foi uma das primeiras a visualizar esse potencial para fazer grana além da própria arte. Inicialmente, os lucros vieram do escritório Caco de Telha, que gerenciou muitas carreiras.
Após romper com o irmão Jesus Sangalo, ela montou a própria estrutura e continuou a lucrar alto, mesmo com o axé em crise e a agenda não tão lotada como há uma década. Ivete praticamente se tornou em um dos nomes mais requisitados e bem pagos das agências publicitárias. Um tuíte ou post no Instagram da cantora pode render até R$ 100 mil.
Daniel, que também seguiu os passos de se autogerenciar, comenta que o leque para investir e lucrar dentro do mercado é bastante diversificado. Por isso, para ele, mais do que nunca o artista precisa ter essa visão empresarial do que faz. Ele, no entanto, alerta que é necessário estar cercado de uma equipe competente, pois seria impossível ter conhecimento de todas as áreas do negócio.

— Eu acho que é muito difícil ficar de fora do universo como um todo. O artista tem que ter uma visão, tem que se inteirar de tudo que envolve a carreira. Mas não querer fazer tudo. A gente tem que ter as pessoas certas para gerenciar, porque é muita coisa para resolver. Além disso, temos que cuidar do lado artístico e produzir. Isso é fundamental.
Diversificado
Artistas brasileiros hoje estão por trás não só dos próprios escritórios e de outros cantores. Fernando e Sorocaba, por exemplo, além de gerenciar a FS Shows (com um cast com nomes como Sophia Abrão e Lucas Lucco), investem em casas de show e até produção de discos.
Di Ferrero, vocalista do NX Zero, é dono de um restaurante em sociedade com André Marques.
Zezé Di Camargo, Bruno e Leonardo são nomes de destaque no setor pecuário de corte. Leo, da dupla com Victor também. E vai além: se tornou um famoso palestrante motivacional no segmento corporativo.
Fernando Zor garante que não é mesmo fácil ser um artista multitarefas. Ele, que tem se destacado também como produtor musical, sabe do que fala: afinal, quando não está no palco, está no estúdio com outros artistas.
— Às vezes nos dividimos em quatro, cinco pessoas. Gostamos de tomar as rédeas de tudo, então sempre damos um jeito de resolver as pendências da melhor forma possível.

Mas é obrigatório assumir esse papel para ser bem-sucedido hoje? Fernando faz uma ressalva e diz que não necessariamente. Mas garante que ter consciência de como a estrutura funcional evita que o artista seja vítima de fraudes e promessas infundadas.
Infelizmente, ainda é normal artistas assinarem contratos leoninos e que atrapalham o desenvolvimento de suas prórpias carreiras. Lexa, por exemplo, denunciou a ex-empresária por receber apenas R$ 3 mil por mês no início da carreira.
Paula Fernandes, que integrou o escritório Talismã, de Leonardo, também rompeu com o ex-patrão por discordar da porcentagem que recebia por show.
— É sempre bom o artista ter uma noção de tudo o que acontece na carreira dele, como ela está sendo conduzida, saber como tudo funciona para a carreira dele caminhar direito, para que não caia em alguma mentira ou falsa promessa.