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Presidente da Ucrânia trocou terno e gravata por camiseta e moletom; entenda o motivo

Identidade visual mudou quando o líder surgiu na mídia com o figurino mais básico; com isso, a mensagem transmitida foi outra 

Moda|Mariana Morello, Do R7


Zelenski usou terno pela última vez em fevereiro de 2022
Zelenski usou terno pela última vez em fevereiro de 2022

O presidente ucraniano, Volodmir Zelenski, passou por uma mudança no visual assim que as ameaças da Rússia se tornaram um conflito ativo. Ele resolveu trocar o terno e gravata por uma estética mais básica e informal, com referência militar. Entre as peças estão camisetas e moletons, sempre em tons sóbrios, principalmente verde-militar e preto. A última vez que o chefe de Estado foi visto usando uma vestimenta considerada tradicional para alguém em seu cargo foi em fevereiro de 2022, durante um pronunciamento oficial. A partir daquele momento, toda a identidade visual do presidente mudou e, com isso, a mensagem transmitida também.

Segundo Luís Mauro Sá Martino, professor da Faculdade Cásper Líbero e pesquisador-bolsista em Política e Mídia na Universidade de East Anglia (Inglaterra), nada é gratuito na política e a modificação da aparência foi, sim, parte de uma estratégia. “Cada gesto, roupa, palavra dita ou não dita, cada sorriso ou ausência de sorriso são muito bem programados conforme o efeito que se quer causar”, explica.

Para o professor, Zelenski elaborou estrategicamente essa transformação. “Ele passa a usar uma roupa muito mais simples, que remete ao elemento militar e, a meu ver, até para mostrar: 'olha, agora eu sou mais um defensor da Ucrânia. Eu sou mais um soldado que está lutando pela Ucrânia'”, revela. “Aconteceu uma mudança de posicionamento político muito forte para lembrar todo mundo de que a guerra não é uma situação normal”, acrescenta.

O fenômeno ocorre, segundo o especialista, porque toda pessoa pública, política — sobretudo um chefe de Estado — sabe que mesmo as suas menores ações vão ser comentadas e observadas e, portanto, o que fizer vai surtir um efeito. “Atualmente, política é visibilidade, é visualidade. Política se faz para ser visto. Sendo visto e a maneira como você é visto influenciam o jeito como pessoas vão pensar sobre você”, diz.

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“Quando Zelenski aparece é a Ucrânia que está aparecendo. Seja juridicamente válido, ou não, o líder de um país — rei, presidente ou primeiro-ministro —, representa a nação. Então, quando ele aparece e diz ‘estou aqui’, o povo ucraniano aparece também”, conta Luís Mauro.

NOVO VISUAL

Zelenski em encontro com militar ucraniano
Zelenski em encontro com militar ucraniano

Para entender a estratégia por trás da transição, é preciso compreender que moda não é algo fútil e superficial. O Consultor de Moda e Lifestyle Gustavo Sarti ensina que “a moda tem relação direta com a cultura e com a história, é reflexo da forma de pensar de cada época e da vontade de demonstrar desejos e aspirações, por isso, desempenha um papel importante na construção de identidades individuais e coletivas.”

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Para Gustavo, vestir-se de forma adequada para cada situação é mais do que uma questão fashion, é parte da comunicação não-verbal, permitindo que se forme uma impressão positiva da imagem. “A forma de se vestir traduz muito das intenções da pessoa e de como ela quer se posicionar em cada situação. E não podemos desconsiderar aspectos sociais”, declara o profissional.

Sarti acredita que a renovação vivida por Zelenski é parte de uma estratégia de comunicação. “É como se o presidente quisesse transmitir que dá menos importância às formalidades do cargo, já que a prioridade é salvar vidas. Pode ser percebido também como uma tentativa de se conectar emocionalmente com a população, mostrando que o líder está compartilhando suas preocupações”, esclarece.

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Porém, conforme o consultor, pode ter relevância o fato de Zelensky não ter histórico na política, o que traduz uma condição específica mais versátil ao seu estilo e personalidade. “Sua eleição foi vista como uma resposta à insatisfação do público com a corrupção endêmica e os desafios econômicos enfrentados pelo Estado e foi, justamente, uma aposta em algo ‘diferente’ – e assim ele tem se comportado”, finaliza.

Luís Mauro afirma ainda que o visual é uma peça fundamental no jogo da política. “Ao escolher usar uma roupa, você está se posicionando politicamente. Ao longo dos séculos 20 e 21, por exemplo, a roupa formal de chefes de Estado virou o terno e gravata, mas quando olhamos muitas fotos de reuniões de líderes mundiais, percebemos que alguns deles vão optar por colocar um traje que a gente chamaria de ‘típico do próprio país’ para comunicar: ‘Olha, o seu traje formal é o terno e gravata, mas o meu traje formal é esse aqui’. E isso não significa que um é melhor ou pior que o outro. Isso é uma tomada de posição”.

Rainha Elizabeth 2ª
Rainha Elizabeth 2ª

Outro exemplo de comandante que mudou a forma de se vestir com um propósito maior é a Rainha Elizabeth 2ª, do Reino Unido, como ilustra o professor: “Ela sabia que para ser o centro das atenções não bastava ser a rainha da Inglaterra, ela precisava também se destacar fisicamente nos ambientes. Então, durante 40 anos, ela usou um figurino que sempre a diferenciou das outras lideranças onde quer que ela estivesse”.

Deniza Gurgel, jornalista especialista em estratégia de imagem, considera a mudança correta e bem executada. Segundo a especialista, quando falamos dos motivos por trás da troca de aparência, devemos avaliar três coisas: público, mensagem e ambiente.

“O público do Zelenski é prioritariamente os cidadãos que estão ali vivendo a guerra, mas ele também tem que se comunicar com o público externo, que precisa ser constantemente lembrado que a Ucrânia está em guerra, em busca de sensibilização e apoio. Já o ambiente é a realidade da guerra, um local onde, realmente, faz muito mais sentido ele usar roupas com referência militar do que terno e gravata. E a mensagem transmitida é ‘minha pátria está em guerra e eu estou junto com o meu povo na batalha’”, descreve Deniza.

Segundo a jornalista, a estratégia está sendo bem-sucedida, porque causa aproximação e reforça que ele entende quais são as dores do povo, além de mostrar que ele está vivendo a mesma realidade da população.

“Outro ponto importante é que chama atenção de fora do país. A mídia está falando sobre as vestimentas dele. Quando ele vai para encontros com autoridades internacionais e está usando essas camisetas, destoa nas fotos, chama atenção e faz com que as pessoas relembrem que existe essa guerra e que a Ucrânia está sofrendo as duras consequências dela”, comenta.

ZELENSKI X PUTIN

Zelenski, da Ucrânia, e Putin, da Rússia
Zelenski, da Ucrânia, e Putin, da Rússia

De acordo com o professor Luís Mauro, o líder de uma nação precisa se preocupar com duas imagens, a externa e a interna. Enquanto Putin continua usando signos que entendemos como tradicionais para um chefe de Estado, Zelenski abriu mão da convenção para fazer um jogo mais amplo.

Para Deniza, a atitude do chefe russo causa um distanciamento entre ele e o público. “Putin pode gerar a interpretação de que está seguro, protegido em seu gabinete, enquanto a população está batalhando. Por outro lado, Zelenski se coloca no mesmo patamar dos soldados”, analisa.

Outra diferença é na comunicação direta e verbal com o resto do mundo. Enquanto o ucraniano tem um perfil no Instagram com 17 milhões de seguidores, o presidente russo nem tem uma conta na rede social.

Para o professor, a impressão que fica é que Zelenski está tentando falar com todo mundo ao mesmo tempo, enquanto Putin se fechou. “Além de todas as questões da guerra, o ucraniano tem outro desafio que é ser lembrado o tempo todo, porque a tendência é que, por mais que você se interesse pelo assunto, depois de um tempo a temática sai de pauta, e se a Ucrânia perde destaque ela deixa de ganhar apoio público e investimento.”

PRESENÇA NAS REDES SOCIAIS

Zelenski em visita a um hospital
Zelenski em visita a um hospital

Quando falamos de imagem, não podemos levar em consideração só as roupas que alguém usa. Também é importante analisar como e por onde essa pessoa se comunica. O conjunto de signos agrega valor à narrativa. Como dito acima, Zelenski é extremamente ativo no Instagram, por exemplo.

O chefe de Estado usa a plataforma para compartilhar registros de reuniões estratégicas, visitas a soldados feridos, hospitais e postos de combate, e conversa diretamente com os seguidores. Essa postura serve para aproximar ainda mais o presidente dos públicos interno e externo, mostrando que a estratégia de comunicação é multidisciplinar.

A sensação de navegar pelas postagens feitas é de que o internauta está participando da guerra. No conflito temos, desde o começo, uma tentativa de colocar pessoas em determinadas posições. Por fatores territoriais, demográficos e por ser o país invadido, a Ucrânia tende a ser enxergada como vítima que está resistindo. Essa forma de comunicação adotada só reforça este status.

PASSADO ARTÍSTICO

Zelenski vem de uma carreira como ator e comediante e resolveu largar tudo em 2019 para se eleger à presidência do país. Porém, esse contexto artístico beneficia a vida política do governante?

Para Luís Mauro a resposta é sim e não. “Certamente como uma pessoa do meio artístico, o presidente sabe o efeito que uma mudança de figurino produz, e o que a roupa usada provoca no público. Porém, não podemos esquecer que toda figura política está rodeada por uma equipe especializada na sua comunicação”, pondera.

“Mesmo que Zelenski não viesse do campo artístico, a gente espera que ele tenha todo um conjunto de assessores que indiquem para ele qual a melhor roupa usar e como de comunicar. Agora é claro que sendo uma pessoa do meio a gente já pode presumir que ele tem um olhar treinado”, complementa.

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