Análise: Onde está o discurso 'a economia a gente vê depois'?
Para minimizar os prejuízos do Metrô de SP, João Doria diminui o número de trens em circulação e causa aglomerações
Patricia Lages|Patricia Lages
Aquela conversa de que vidas estão em primeiro lugar e a economia a gente vê depois não serve para todo mundo, mas tem servido muito bem ao governo do estado de São Paulo em seu plano de manter a população quietinha, achando que tudo é para seu próprio bem. Enquanto as pessoas ficam mansinhas em suas casas e o comércio baixa as portas acumulando prejuízos, João Doria (PSDB) toca outro plano: o de salvar as contas do governo — que ele mesmo arruinou — ainda que coloque em risco as vidas de milhões de pessoas.
Diante da desastrosa política de trancar tudo e restringir horários (como se o vírus desse trégua em determinados momentos do dia) um dos efeitos foi o maior prejuízo da história no Metrô de São Paulo, chegando à casa de R$ 1,7 bilhão. Para equilibrar as contas, Doria retirou composições de circulação, ampliando o tempo de espera e causando ainda mais aglomerações. Se o discurso de Agripino fosse real ele não colocaria em risco as vidas dos milhões de passageiros e manteria os trens em circulação independentemente da perda econômica. E sobre o rombo nas contas, o gestor “resolveria depois”, afinal, é isso que ele vem dizendo há mais de um ano quando qualquer setor se manifesta cobrando soluções para equilibrar suas contas.
Dados do Relatório Integrado Anual do Metrô, obrigatoriamente publicado no Portal da Transparência, dão conta de que Doria retirou trens não só durante os intervalos com menos movimento, mais também, nos horários de pico. Para seus desafetos políticos, qualquer aglomeração é classificada como “genocídio”, mas quando a ordem vem dele mesmo, é só mentir e mandar mentir que tudo se resolve.
Informações oficiais contrariam o que o secretário dos Transportes, Alexandre Baldy, afirmou várias vezes em diversas entrevistas, dizendo que o Metrô estava operando normalmente, com 100% das composições em circulação. Não, não estava. E o próprio relatório desmente. Mas isso não é novidade alguma em um governo que diz uma coisa, mas faz outra, cujo governador, ainda prefeito, jurou que cumpriria o mandato até o fim, mas depois “mudou de ideia”. Ele também achou melhor não cumprir a promessa feita antes das eleições de que não endureceria as medidas de fechamento do comércio e, igualmente, não viu o menor problema em trancar a população enquanto curtia suas férias, ou melhor o “seu direito”, indo para Miami para fazer comprinhas em loja de grife, sem máscara. Essa é a democracia de João Doria: façam o que eu mando, pois vocês não têm o direito de fazer o que eu faço.
Mas governar não é fazer marketing, nem desfilar de terno bem cortado e gravata de grife, enquanto a população não sabe mais o que fazer para pagar as contas que já se tornaram dívidas. Governar é praticar a justiça sem olhar a quem e sem se servir do povo a quem deveria servir. Governar é algo muito diferente da forma como o estado mais rico do Brasil vem sendo tratado por um punhado de políticos liderado por alguém que só pensa em si mesmo. É triste, é lamentável e é para guardar na memória até 2022.
Autora
Patricia Lages é autora de 5 best-sellers sobre finanças pessoais e empreendedorismo e do blog Bolsa Blindada. É palestrante internacional e comentarista do JR Dinheiro, no Jornal da Record.
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