Análise: Você consome para viver ou vive para consumir?
Que o ter está acima do ser na atual sociedade você já sabe. Mas será que você também tem invertido esses papéis?
Patricia Lages|Patrícia Lages, do R7

Em seu livro Mentes Consumistas, a médica psiquiatra Ana Beatriz Barbosa Silva destaca uma frase que resume muito bem a sociedade de hoje:
“Nunca antes, na história da humanidade, os seres humanos tiveram tanto acesso a bens materiais. Nunca também tivemos tantas pessoas insatisfeitas, ansiosas e compulsivas por comida, drogas, compras, jogos, sexo etc. Onde falhamos?”
E quanto à realidade atual, a autora afirma que “a sociedade em que vivemos tem como senso comum vigente o modo ter de estabelecer suas regras e seus valores”. E que “nesse contexto social, é necessário possuir tudo o que seja capaz de gerar prazer de forma intensa e imediata”.
Porém, o resultado de uma vida que prioriza o ter é desfrutar de momentos de prazer cada vez menos duradouros, o que leva as pessoas a um tipo de escravidão. Ou seja, é preciso cada vez mais aumentar os esforços para sentir um prazer cada vez mais passageiro. É o mesmo problema que acontece com todo tipo de vício, onde o adicto precisa se aprofundar cada vez mais no mau hábito para sentir cada vez menos prazer. E, para piorar a questão do ter acima do ser, a sociedade glamoriza o consumismo ao mesmo tempo que desvaloriza o conhecimento e a espiritualidade.
O prazer de ter um carro melhor que o do vizinho — e despertar inveja bairro afora — faz a pessoa assumir um financiamento que exigirá que ela trabalhe cada vez mais. Em vez de sentir prazer com o automóvel que adquiriu, a pessoa sente temor e ansiedade só de imaginar a vergonha que passaria diante da vizinhança se o seu precioso bem fosse apreendido por falta de pagamento.
E o que muitas pessoas fazem quando o prazer se esvai e a responsabilidade fica? Buscam o próximo momento de prazer adquirindo mais coisas — ainda que seu orçamento não permita — sem perceberem de que estão, cada vez mais, tornando-se escravos dessa dinâmica viciada.
A coisa piora quando a pessoa se dá conta de que o guarda-roupa lotado não traz mais satisfação, afinal, os exageros nas refeições (também em busca de prazer) mudaram sua silhueta e nada está lhe caindo bem. De que o carro comprado há pouco tempo já não é o mais desejado, afinal lançaram um modelo novo. E de que ter gasto o 13º salário inteiro nas férias não valeu tanto a pena, afinal, ao chegar em casa, a caixa do correio está repleta de boletos que não têm como ser honrados.
Se este texto parece um raio-X da sua vida, saiba que você não canta sozinho nesse coro. Estamos entrando na primeira semana útil do ano para muita gente, portanto, não há momento melhor para dar uma guinada e colocar a vida no caminho certo. Isto é, naquele onde o ser está acima do ter.
Patricia Lages
É jornalista internacional, tendo atuado na Argentina, Inglaterra e Israel. É autora de cinco best-sellers de finanças e empreendedorismo, palestrante e conferencista do evento “Success, the only choice” na Universidade Harvard. Apresenta quadros de economia na TV Gazeta e RecordTV e é facilitadora da RME para o programa mundial WomenWill – Cresça com o Google.