Cem por um: o preço da vida em tempos de guerra
Israel liberta 2 mil prisioneiros palestinos, incluindo 250 condenados à prisão perpétua, em troca de 20 reféns israelenses

O acordo, firmado dois anos após os ataques de 7 de outubro, representa mais que um cessar-fogo: é um retrato simbólico daquilo que cada lado entende por valor da vida humana.
De um lado, um Estado que negocia a libertação de milhares de prisioneiros para resgatar poucos reféns: cem por um. Do outro, um grupo terrorista que sequestra, mata e usa inocentes como escudos. O contraste é brutal, mas não novo. A história do povo judeu é, há séculos, a história da resistência de quem escolhe preservar a vida enquanto o mundo insiste em cultuar a morte.
Durante a Idade Média, entre 1347 e 1351, a Peste Negra dizimou entre 25% e 50% da população europeia. Incapaz de compreender a origem da doença, a humanidade fez o que costuma fazer diante do medo: buscou culpados. E, como tantas vezes, encontrou nos judeus o bode expiatório perfeito.
Acusados de envenenar poços, milhares foram perseguidos, queimados vivos e expulsos de suas cidades, não porque fossem culpados, mas porque morriam menos.
A ironia trágica é que o motivo era simples: judeus viviam isolados, praticavam hábitos de higiene e seguiam rituais religiosos (como lavar as mãos antes das refeições e banhos rituais) que, sem saber, os protegiam da bactéria causadora da doença. Mas a razão não importava, o ódio, sim. Assim nascia mais um capítulo do antissemitismo europeu que, séculos depois, culminaria no Holocausto.
Avançamos para o século XXI e o padrão se repete: quando o terror ataca Israel, o mundo se apressa em julgar sua defesa, mas raramente questiona a origem da agressão. Em junho deste ano, a jornalista Eliane Cantanhêde perguntou por que “os mísseis do Irã caem em Israel e não matam ninguém”, acrescentando que havia apenas “uma ‘mortezinha’ daqui, outra dali”. A resposta veio de Rafael Rozenszajn, porta-voz das Forças de Defesa de Israel: “Porque nós protegemos nossos civis; eles os usam como escudos. Nós construímos bunkers e sistemas de defesa; eles constroem ódio, túneis e mísseis.”
A frase resume uma diferença civilizacional que muitos se recusam a enxergar: há povos que constroem para viver e outros que destroem para existir. Golda Meir, primeira-ministra de Israel entre 1969 e 1974, disse certa vez: “Se Israel largar suas armas, será destruído. Se nossos inimigos largarem as deles, haverá paz.”
Cem por um. Não é uma questão de matemática, mas de valores. Enquanto uns contam corpos, outros contam vidas. E continuam, contra tudo e todos, a lutar por elas.