Logo R7.com
Logo do PlayPlus
Patricia Lages

Empobrecimento programado: como Brasil está se tornando uma fábrica de pobres em larga escala

Ampliação do assistencialismo sem qualquer contrapartida transforma milhões de brasileiros em reféns da pobreza

Patricia Lages|Patricia LagesOpens in new window

Sem prazo determinado e sem qualquer contrapartida da parte de quem recebe, assistencialismo torna milhões de brasileiros reféns da pobreza

João Francisco, nascido no interior do Maranhão, resolveu mudar para a capital em busca de oportunidades. Seu sonho, assim como o de milhões de brasileiros, era dar um pouco de conforto à família, “sem luxos”, como ele sempre dizia. Como ajudante de obra, João conseguiu um cômodo de seis metros quadrados na periferia de São Luís, cedido pela pequena construtora em que trabalhava. Assim, a esposa e os dois filhos do casal puderam se mudar também.

No cômodo não havia nada além de um colchão surrado, um rádio de pilha, uma espiriteira e um balde para pegar água na torneira do quintal que também servia os demais vizinhos.

João não cabia em si de felicidade de ter a família reunida novamente, mas temia pelo futuro dos filhos, afinal, eram mais três bocas para alimentar. Foi aí que um dos vizinhos o abordou com informações que pareciam ser solução de todos os seus problemas:

“Como tu não é registrado, tu pode receber o Bolsa Família. É seiscentos real por mês limpinho na mão. Tu também recebe 150 real e mais 51 real do Bolsa Escola pra cada filho. E tem o vale gás que tu recebe 108 real. Só aí já dá pra mais de 1.100 real!”


João Francisco lembrou que o patrão prometeu registrá-lo no mês seguinte e que o combinado era que a mulher trabalharia meio período, dois dias por semana, em uma casa de família enquanto os meninos iam para a escola. A renda dos passaria dos R$ 1.100 em benefícios e, dependendo de como a esposa se saísse no trabalho, poderia conseguir mais uma casa e dobrar o ganho. E se ele fizesse uns bicos, poderiam juntar dinheiro e mudarem para uma casa de verdade, com banheiro e energia elétrica sem “gato”.

“Tu é doido, homem?”, perguntou o vizinho. “Tu e a tua mulher vai se matar de trabalhar pra quê se tu pode receber sem fazer nada? Deixe de besta, homem!”


João Francisco viu que realmente não fazia sentido. Então, pediu ao patrão que não o registrasse e deu entrada nos programas de assistência. E não é que era tudo verdade? João passou a receber o dinheiro todo mês, sem ter de fazer absolutamente nada! Era só a mulher não arranjar trabalho e ninguém saber que ele tinha emprego. Porém, para o azar da família, o impensável aconteceu: João foi denunciado e quase perdeu o benefício. Mas pediu demissão depressa e, com ajuda de uma advogada, continuou a receber.

João e a família dependem 100% dos programas do governo há quase seis anos, ainda mais agora que a situação mudou: os filhos cresceram e o valor do benefício por criança diminuiu. Por outro lado, eles tiveram mais um filho que logo vai para a escola e a situação vai se equilibrar novamente, pelo menos por mais uns anos.


A família teve de mudar para outra comunidade desde que João saiu da construtora. Apesar de o barraco agora ser de madeira e não mais de alvenaria, eles têm uma torneira de água exclusiva e um “gato” fornece eletricidade. João nunca mais se arriscou a pegar um bico porque teme ser denunciado novamente, mas está tranquilo passando os dias tentando a sorte nos casinos on-line. Uma vez ele ganhou R$ 100, mas não tem ideia de quanto já perdeu. Os filhos não faltam as aulas, embora não estejam indo nada bem: não sabem ler nem fazer contas. “Eles conseguem ‘fazer o nome’ e já tá bom!”, diz a mãe, enquanto o pai concorda que é o suficiente já que eles não pretendem trabalhar para poderem manter “seus direitos”.

De qualquer forma a família está confiante no programa Maranhão Livre da Fome, que deve começar a funcionar no mês que vem. Eles poderão receber mais um benefício: R$ 200 por mês para comprar comida (ou qualquer coisa que quiserem) e mais um adicional de R$ 50 por filho. Serão R$ 550 a mais todos os meses e tudo o que eles precisam fazer é continuarem sendo reféns da pobreza.

Praticamente metade do Brasil tem mais pessoas recebendo Bolsa Família do que trabalhando. Atualmente, treze estados são sustentados por programas sociais bancados pelos impostos pagos pelos demais quatorze. Caso o número de beneficiários continue crescendo, em breve teremos um novo marco: mais estados com pessoas vivendo de benefícios – e reféns da própria pobreza – do que pessoas trabalhando e produzindo. A família de João Francisco é apenas uma delas.

Os textos aqui publicados não refletem necessariamente a opinião do Grupo Record.

Últimas


Utilizamos cookies e tecnologia para aprimorar sua experiência de navegação de acordo com oAviso de Privacidade.