Abandono paterno é naturalizado e isso é uma crueldade
Sociedade é complacente com pais que não registram os filhos ou que ficam ausentes da vida das crianças e dos jovens, o que é um erro brutal
Blog da DB|Do R7 e Deborah Bresser

Há cerca de 5,5 milhões de crianças brasileiras sem o nome do pai no registro de nascimento, segundo dados do CNJ (Conselho Nacional de Justiça), mas esta é só uma face do abandono paterno.
O número de filhos com o nome do pai no documento, mas ausente da vida, não está nas estatísticas. Em qualquer que seja o caso, os resultados dessa distância são avassaladores. O estrago emocional é inevitável, mas ninguém parece ligar para isso.
Um homem fugir da responsabilidade de ser pai é visto como algo quase natural. Há uma passividade social em relação ao abandono paterno, ninguém acha um absurdo um cara ter um filho e dar no pé, assim como não causa indignação o fulano que se separa e não paga pensão ou não aparece no dia da visita.
Mas a dor que esses homens causam só os filhos do abandono podem contar. No livro “Cadê você? As pessoas por trás do abandono paterno” há 11 relatos reais, de gente que foi deixada pelo caminho pelos pais. Erika Neves, do Estúdio Aspas, foi responsável pela edição do material, concebido originalmente como um trabalho de conclusão de curso de cinco estudantes de Jornalismo.
"O curioso é que todas as pessoas envolvidas no processo tinham passado por isso. São relatos reais de quem viveu esse abandono, com histórias diferentes, mas com várias experiências semelhantes", conta.
Lembranças de ocasiões especiais em que o pai deveria chegar e não chega, em que ele não aparece para a visita, não está disponível, são comuns a várias vítimas. Gestos que demonstram a desimportância dos filhos vão se acumulando e causam uma instabilidade emocional, falta de confiança e dificultam as relações ao longo do tempo. "Conforme vai passando de um relato para outro, as pessoas acabam verbalizando o que as vivências causaram neles. Isso vai interferir nas relações desses filhos já adultos com outros adultos", acredita Erika.
O objetivo do livro, que pode ser encontrado no estudioaspas.com.br, é justamente parar de banalizar essa falta. "Socialmente, se uma mãe abandona um filho será apedrejada em praça pública. Um pai que abandona não tem impacto social, ninguém julga, as pessoas acham comum. Relativizar a responsabilidade de um pai é ignorar os efeitos que isso causa nos filhos."
É preciso parar de passar pano para homem que abandona filho. É louvável iniciativas como a da Defensoria Pública de São Paulo, de fazer mutirão para reconhecimento de paternidade. Mas ser pai é muito mais do que assinar o RG. Os homens precisam entender o papel fundamental que têm na criação de um ser humano que colocaram no mundo. O abandono paterno é uma realidade de proporções assustadoras no Brasil e tem de ser combatido.
Temos de conscientizar os homens de que a paternidade não é atividade de lazer. Exige comprometimento, entrega, participação, afeto e responsabilidade. Esse "oba oba" gera traumas e afeta duramente o desenvolvimento psicológico dos filhos abandonados. Até quem jura que não faz diferença, que nunca sentiu falta do pai, acaba sofrendo as consequências, mais dia, menos dia. E é de uma crueldade sem limites. Que neste Dia dos Pais os fujões possam refletir sobre sua covardia.