Ciclo menstrual e musculação: entenda a relação
Como as variações hormonais ao longo do mês podem influenciar força, resistência e recuperação

Em uma entrevista à beira da piscina em 2016, a nadadora medalhista de bronze olímpica Fu Yuanhui discutiu sua menstruação como um fator que afetava seu desempenho nos Jogos Olímpicos. Ela é uma das várias atletas que começaram a falar publicamente sobre como o ciclo menstrual afeta o desempenho atlético. E o tema vem ganhando cada vez mais atenção na ciência e entre profissionais da saúde. Para mulheres que treinam força, atletas ou não, entender essas variações hormonais pode ser a chave para otimizar os resultados e, inclusive, reduzir o risco de lesões.
Como o ciclo menstrual afeta o corpo no treinamento de força
O ciclo menstrual é dividido em quatro fases principais: menstrual, folicular, ovulatória e lútea. Cada uma é marcada por variações nos níveis de estrogênio e progesterona, hormônios que influenciam diretamente a energia, a força, a recuperação muscular e até mesmo a percepção de esforço. “Conforme as fases do ciclo menstrual, a paciente pode apresentar algumas alterações de humor e mais propensão a atividade física”, explica o ginecologista Rodrigo Ferrarese.
Para entendermos melhor como funciona a relação ciclo menstrual x treino, pedimos para o doutor Rodrigo Ferrarese explicar cada fase:
Fase folicular
Esta fase é considerada o “período de ouro” para treinos de força. “Na primeira fase, que a gente chama de fase folicular, é quando a paciente continua desenvolvendo os folículos para ter a ovulação, o estrogênio (um dos hormônios femininos) fica mais alto e aí isso vai dar um pouco mais de disposição e força para paciente, mas mais ânimo para ela”. É o momento ideal para aumentar cargas e investir em treinos de hipertrofia. O corpo lida melhor com o estresse físico, e o risco de inflamações é menor.
Ovulação
No meio do ciclo, quando a mulher vai ovular, ocorre um pico maior ainda de estrogênio e de outro hormônio que a gente chama de LH. Tem mulher que tem dor com a ovulação, mas não é a maioria. Tirando esse fato, as pacientes geralmente se sentem bem. A libido está mais alta, elas têm mais disposição, elas têm mais energia”. Neste período, a força muscular tende a estar em alta.
Fase lútea
“A última fase do ciclo, quando a paciente já está perto de menstruar. Neste momento começam os sintomas de TPM, cansaço, alterações de humor, irritabilidade. Isso faz com que a mulher tenha uma diminuição da performance”. É um bom momento para reduzir a intensidade dos treinos, focar em exercícios funcionais ou treinos regenerativos.
Fase menstrual
Durante a menstruação, tanto o estrogênio quanto a progesterona estão em níveis baixos. Algumas mulheres sentem queda de energia, cólicas e desconfortos que podem impactar o rendimento. Para outras, o treinamento pode seguir normalmente. “Depende muito de cada paciente. Se ela tiver bem, não tem problema nenhum, pode continuar o treinamento de força normalmente”, reforça o doutor. Neste momento, “escutar” o próprio corpo é fundamental.
Cuidado com lesões nos dias férteis
Um estudo recente publicado no Journal of Exercise Physiology Online, apontou que as mulheres têm de 3 a 6 vezes mais probabilidade do que os homens de sofrer lesões no ligamento cruzado anterior (LCA). “Na ovulação, que começa logo após a fase folicular, acontece um pico do hormônio estrogênio, os ligamentos e tendões ficam mais frouxos por conta disso. Além disso, é uma fase que a mulher está muito bem disposta, o que proporciona treinos mais intensos, aumentando a chance de lesões”, explica o ginecologista Rodrigo Ferrarese.

Paciência na segunda parte do ciclo
Na segunda fase, acontece uma alta da progesterona, que é outro hormônio feminino. Normalmente a mulher sente mais cansaço, mais indisposição e mais inchaço, o que pode dificultar o treino ou causar um certo desânimo. A queda no desempenho é uma experiência perfeitamente normal na fase lútea do ciclo.
Respeitar o ciclo pode melhorar o desempenho
Adaptar o treino às fases do ciclo significa treinar de forma mais inteligente. Respeitar as oscilações hormonais pode contribuir:
- Melhorando o rendimento físico.
- Reduzindo o risco de lesões.
- Aumentando a motivação e adesão aos treinos.
- Promovendo uma relação mais saudável e consciente com o próprio corpo.
A chamada periodização menstrual é uma estratégia usada, inclusive, por atletas de alta performance e totalmente adaptável a nós, mulheres “reais”. Esta técnica consiste em planejar treinos mais intensos nos momentos de pico de energia e adaptar as cargas quando o corpo pede recuperação.
A periodização menstrual nos ajuda a entender que o ciclo menstrual não é um obstáculo para a prática de força — é, na verdade, um aliado para quem entende as variações e adapta os treinos de forma estratégica. Respeitar o próprio corpo e fazer ajustes inteligentes pode levar a ganhos mais consistentes e a uma relação mais positiva com o exercício físico.