Muito além da digestão: o intestino como chave para o bem-estar
Pesquisas científicas e relatos nas redes sociais mostram como o intestino vem ganhando destaque no tratamento de transtornos emocionais e no fortalecimento da imunidade

Você já ouviu falar que “tudo começa no intestino”? Pois é, essa ideia está mais atual do que nunca! Pesquisas científicas têm mostrado que o órgão, conhecido por cuidar da digestão, também pode influenciar diretamente o nosso humor, a saúde mental e até o funcionamento do sistema imunológico. Alterações na flora intestinal estão sendo associadas a problemas como ansiedade, depressão e outros desequilíbrios emocionais. Sim, sua barriga pode estar dizendo muito mais sobre você do que parece.
Estudos publicados nas revistas Frontiers in Medicine e ScienceDirect revelam que desequilíbrios na microbiota intestinal (conjunto de bactérias que habitam o trato digestivo) estão associados a transtornos como depressão, ansiedade e até distúrbios neuropsiquiátricos mais complexos.
Esse novo olhar sobre o intestino ganhou força com o avanço das pesquisas sobre o chamado eixo intestino-cérebro, um sistema de comunicação entre o sistema nervoso central e o trato gastrointestinal, mediado por hormônios, neurotransmissores e células imunológicas. Mais de 90% da serotonina, neurotransmissor ligado à sensação de bem-estar, por exemplo, é produzida no intestino. Isso explica por que alterações na flora intestinal podem afetar diretamente o estado emocional.
Entre as condições que têm despertado interesse crescente da comunidade médica está a SIBO, sigla em inglês para Small Intestinal Bacterial Overgrowth, ou super crescimento bacteriano do intestino delgado. A síndrome ocorre quando há um aumento anormal na quantidade de bactérias nessa região do sistema digestivo, o que provoca sintomas como inchaço, dores abdominais, diarreia, gases e fadiga.
Apesar de ainda pouco conhecida fora do meio clínico, a SIBO vem ganhando visibilidade nas redes sociais, especialmente no TikTok. Influenciadoras de saúde e bem-estar têm relatado experiências pessoais com o transtorno, além de compartilhar cardápios e dietas adaptadas para conviver melhor com a condição. A exposição tem gerado debates, alertas e também impulsionado a busca por diagnósticos mais precisos.
A criadora de conteúdo e influenciadora digital Laura Vasconcelos, de 29 anos, é uma das vozes mais ativas sobre o tema nas redes. Ela começou a falar sobre SIBO após anos de desconfortos e exames sem diagnóstico conclusivo. “Eu sentia muito cansaço, minha barriga vivia estufada e comecei a achar que era psicológico. Só fui descobrir o SIBO depois de muita insistência. Quando compartilhei minha história, não esperava tanta gente passando pelo mesmo. Hoje, além do tratamento, adaptei toda minha alimentação, e isso transformou minha saúde física e mental”, conta Laura em um vídeo publicado em sua página pessoal.
Para entender melhor o assunto, sabatinamos o doutor Thiago Rocha, endoscopista do Hospital Leforte. Ele respondeu todas as dúvidas relacionadas à saúde do nosso intestino. Confira!
1.Como o intestino pode influenciar diretamente a saúde mental?
O intestino tem influência direta sobre o sistema nervoso central através da ligação entre dois sistemas, o Sistema Nervoso Entérico(SNE) com o Sistema Nervoso Central (SNC), chamado de eixo intestino-cérebro.
2. O que é o “eixo intestino-cérebro” e como ele funciona?
O eixo intestino-cérebro é uma comunicação entre o sistema digestivo e o cérebro. Basicamente, ele envolve uma troca de informações entre o intestino e o cérebro, que acontece por meio de sinais nervosos, hormonais e imunológicos. Tal eixo é uma via de comunicação que ajuda a manter o equilíbrio do corpo, mostrando como o que acontece no seu intestino pode afetar seu cérebro e vice-versa.
3. Quais são os mecanismos biológicos que conectam o intestino à saúde mental?
A nossa microbiota intestinal tem um papel muito importante no nosso bem-estar emocional e cognitivo. Ela ajuda a regular a produção de neurotransmissores, como a serotonina, que influencia o humor, o sono e o apetite. Além disso, a microbiota participa da comunicação entre o intestino e o cérebro, conhecida como eixo intestino-cérebro, ajudando a manter o equilíbrio emocional e a melhorar a função cognitiva. Quando a microbiota está equilibrada, ela contribui para uma mente mais saudável e um humor mais estável.
4. Poderia explicar o papel das bactérias intestinais (microbioma) no equilíbrio emocional e na cognição?
A conexão intestino-cérebro envolve uma complexa rede de comunicação entre o sistema nervoso central e o sistema nervoso entérico (o “cérebro do intestino”), influenciada por hormônios, neurotransmissores, o sistema imunológico e a microbiota intestinal. Sendo o intestino responsável por cerca de 90% da produção de serotonina (responsável pelo bem-estar e sono). Quando o mesmo tem algum distúrbio, esta produção pode estar prejudicada e influenciando diretamente o emocional e sono do indivíduo.

5. Qual é o papel do intestino na regulação do sistema imunológico?
O intestino tem um papel central e estratégico na regulação do sistema imunológico, ele é, na verdade, o maior órgão imunológico do corpo humano, contendo cerca de 70 a 80% das células imunológicas. Isso acontece porque ele está constantemente exposto a microrganismos, alimentos e substâncias do ambiente externo, exigindo uma vigilância constante do sistema imune.
6. Que tipo de desequilíbrio no microbioma intestinal pode prejudicar o sistema imunológico e levar a doenças?
O desequilíbrio na microbiota intestinal, chamado de disbiose, pode prejudicar seriamente o sistema imunológico porque rompe o delicado equilíbrio entre microrganismos protetores e patógenos, o que afeta a barreira intestinal, a produção de substâncias reguladoras e a resposta imune adequada.
7. Você poderia explicar como a permeabilidade intestinal (ou “intestino permeável”) está relacionada à inflamação crônica e ao enfraquecimento do sistema imunológico?
O intestino permeável (ou aumento da permeabilidade intestinal) pode levar à inflamação crônica porque rompe uma das principais funções do intestino: servir de barreira seletiva entre o ambiente externo (alimentos, bactérias, toxinas) e o restante do corpo. Quando essa barreira falha, substâncias que não deveriam entrar na corrente sanguínea conseguem passar e ativam o sistema imunológico de forma persistente.
8. Quais são as principais práticas alimentares ou hábitos de vida que favorecem a saúde do intestino e, consequentemente, fortalecem o sistema imunológico?
Cuidar da saúde intestinal vai muito além de tomar probióticos. Envolve hábitos de vida consistentes que fortalecem a microbiota, mantêm a integridade da barreira intestinal e regulam o sistema imunológico.
9. Quais exames podem ser feitos para avaliar a saúde intestinal e seu impacto na saúde mental e imunológica?
Avaliar a saúde intestinal de forma completa pode envolver uma combinação de exames laboratoriais, de fezes, de sangue, testes funcionais e, em alguns casos, exames de imagem. A escolha depende dos sintomas e do objetivo da investigação (como disbiose, inflamação, intolerâncias, ou doenças intestinais mais graves).
10. Quais são os tratamentos mais comuns para equilibrar o microbioma intestinal e melhorar tanto a saúde mental quanto a imunológica?
Podemos listar: intervenções alimentares, uso de suplementos específicos, manejo do estilo de vida e, em alguns casos, tratamentos médicos mais direcionados. O objetivo é restaurar a diversidade e o equilíbrio das bactérias benéficas, reduzir o crescimento de micro-organismos patogênicos e fortalecer a barreira intestinal.
11. Suplementos probióticos e prebióticos são recomendados para tratar desequilíbrios intestinais? Como eles podem ajudar na saúde mental e imunológica?
Os probióticos e prebióticos desempenham um papel crucial na saúde mental e imunológica devido à sua influência sobre o microbioma intestinal, que está intimamente ligado ao cérebro e ao sistema imunológico por meio do eixo intestino-cérebro e do eixo intestino-imunológico. Ex: Probióticos como Lactobacillus e Bifidobacterium podem modular a produção de neurotransmissores no intestino, como serotonina (muito associada ao humor), dopamina e ácido gama-aminobutírico (GABA).
O crescente protagonismo do intestino nas discussões sobre saúde mental e imunológica aponta para uma abordagem mais integrada da medicina. Cuidar da flora intestinal, manter uma alimentação equilibrada e evitar o uso indiscriminado de antibióticos são passos fundamentais não só para o bem-estar físico, mas também para o equilíbrio emocional.
E para finalizar, dicas excelentes do doutor Thiago para cuidar da saúde intestinal:
. Consumir alimentos ricos em fibras.
. Incluir alimentos fermentados (probióticos naturais)
. Comer alimentos integrais e minimamente processados
. Manter uma boa hidratação
. Evitar açúcar e farinhas refinadas
. Reduzir o estresse crônico
. Dormir bem (7 a 9 horas por noite).
. Praticar atividade física moderada e regular
. Evitar uso excessivo de medicamentos desnecessários