Gordofobia médica: eu já fui vítima e 60% das pessoas com sobrepeso ou obesidade também
Para tratar a obesidade, é necessário procurar ajuda médica — e é justamente aí que começa um dos maiores obstáculos

O termo gordofobia se tornou cada vez mais comum nos últimos tempos. Gordofobia é o preconceito, estigma e discriminação contra pessoas consideradas gordas ou obesas. Trata-se de uma forma de exclusão que se manifesta de várias formas, desde comentários depreciativos até a negação de acesso a serviços e espaços, inclusive no ambiente médico.
Para tratar a obesidade, é necessário procurar ajuda médica — e é justamente aí que começa um dos maiores obstáculos. Muitos profissionais da saúde são gordofóbicos.
Uma pesquisa da ABESO (Associação Brasileira para o Estudo da Obesidade e da Síndrome Metabólica) mostra que 60,4% das pessoas com sobrepeso ou obesidade relataram ter sofrido gordofobia durante consultas médicas.
Quanto maior o grau de obesidade, maior o número de relatos de constrangimento. Quase 100% das pessoas com obesidade grau III afirmaram ter passado por alguma situação constrangedora.
No início dos anos 2000, eu frequentava uma endocrinologista que tinha, no consultório, uma placa com o símbolo de “proibido gordo”. Na época, eu achava aquilo engraçado, acreditava que a abordagem funcionava — mas eu ainda não era obesa e não compreendia a gravidade dessa doença. Com o tempo, entendi o absurdo: como um médico pode, logo de cara, excluir pessoas doentes?
Em 2020, eu senti na pele o que é a gordofobia médica. Assim que descobri que estava grávida, procurei uma obstetra com quem já tinha um bom histórico. Sempre fui bem tratada por ela, mas tudo mudou quando me tornei uma gestante obesa — e em plena pandemia.
O medo que ela tinha de que eu desenvolvesse hipertensão ou diabete era tão grande que me causou traumas. Em toda consulta ela media minha pressão e dizia: “Não é possível que está normal, essa pressão vai subir. Precisamos cuidar disso!”.
Em pouco tempo, toda vez que ela media a minha pressão, ela estava alterada. Eu havia desenvolvido a síndrome do jaleco branco. Mas ela não acreditava. Com menos de três meses de gestação, fui obrigada a fazer um MAPA (monitoramento da pressão por 24 horas) para provar que minha pressão só se alterava no consultório dela.
Outro ponto foi a diabete. Ela tinha certeza de que eu teria diabete gestacional. Felizmente, não tive. Mesmo assim, ela me pediu para fazer uma curva glicêmica na 6ª semana de gestação — um exame que, segundo os protocolos, só deve ser realizado entre a 24ª e a 28ª semana.
A falta de preparo para lidar com uma paciente obesa também é uma forma de gordofobia. Lembro bem que, na 14ª semana de gestação, ela tentou ouvir o coração do meu bebê com um sonar — um dispositivo portátil para auscultar os batimentos cardíacos do feto.
Ela não conseguiu escutar nada. Aflita, me mandou imediatamente para o hospital dizendo: “Não sei se o bebê está vivo.” Ele estava. O que ocorreu foi que a baixa idade gestacional, somada à gordura abdominal, impossibilitava a detecção do som. No hospital, ouvi dos médicos: “Faltou sensibilidade da sua médica ao lidar com uma paciente obesa.”
Ainda durante a gravidez, enfrentei outras situações dolorosas. Fui ao dermatologista em busca de um creme para prevenir estrias. Já tinha algumas por conta do ganho de peso, e queria evitar que aumentassem com a gestação.
Ao entrar no consultório, o médico me olhou e disse: “Nossa, por que você comeu tanto para ficar gorda desse jeito? E ainda ficou grávida? Agora não tem o que fazer.” Saí de lá aos prantos. Pensei mil vezes em denunciá-lo, mas me faltaram forças e coragem.
Ouvi de algumas pessoas: “Ah, não fique chateada, a velha guarda médica é assim.” Mas não precisava ser.
Profissionais de saúde precisam estar preparados para atender pessoas gordas. Ainda hoje, há clínicas que se recusam a realizar exames em pacientes com mais de 120 kg — só hospitais aceitam. Pessoas obesas precisam ser acolhidas e tratadas com respeito em qualquer ambiente médico.
Se você já sofreu gordofobia, sinta-se acolhido.
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