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A treta entre Rachel de Queiroz e Caio Fernando de Abreu

Até onde sei|Gabriel Kwak

Em época de paixões tão acirradas e discussões tão virulentas, vale lembrar um entrevero entre escritores justamente por causa do matiz ideológico.

Talvez a maior romancista brasileira do século XX, Rachel de Queiroz, parece-me, não era de levar desaforo pra casa (relevem-me a expressão-clichê “levar desaforo pra casa”).

O falecido — e quando queria tremendamente venenoso — Bruno Tolentino confidenciou-me que apelidava sua amiga Rachel de “Cascavel de Queiroz”.

Lembro que num “Roda-Viva”, da TV Cultura, de 1991, a aparentemente simpática velhinha, encontrou uma reverencial bancada de entrevistadores, com exceção de um contrariado arguidor: o escritor Caio Fernando de Abreu, autor do excepcional livro de contos “Morangos Mofados”.[aliás, vale a pena ler o livro que Paula Dip dedicou a ele: “Pra Sempre Teu, Caio F.”]

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Em dado momento, aconteceu algo que os mais atentos podiam prever: Rachel e Caio se estranharam. Tudo gravitou em torno das discutíveis simpatias ideológicas da trotskista arrependida Rachel de Queiroz, que teve muitas afinidades com o regime militar.

Despeço-me aqui recuperando, anos-luz, a trombada dos dois [o falecido Jorge Escosteguy era o mediador, o algodão entre cristais, portanto...]

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Caio Fernando Abreu - Quero falar uma última coisa. Estou me sentindo muito constrangido de estar aqui.

Rachel de Queiroz - Por quê?

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Caio Fernando Abreu - E a última coisa, não vou me tornar constrangedor. Por várias coisas que você falou, concluo que você colaborou para coisas muito negativas nesse país, no meu ponto de vista. Compreendo que todos nós somos humanos, erramos, nos equivocamos e tal, mas estou me sentindo extremamente constrangido de estar na posição de render homenagem a um tipo de ideologia que profundamente desprezo. 

Jorge Escosteguy - Caio, você tem que fazer perguntas, e não render homenagem, desculpe.

Caio Fernando Abreu - Está certo.

Jorge Escosteguy - A entrevistada é a escritora Rachel de Queiroz.

Caio Fernando Abreu - Só queria dizer isto: não tenho mais perguntas a fazer. Minha participação se encerra aqui.

Rachel de Queiroz - Gostaria de responder a você que nós estamos num país democrático, eu respeito as suas posições e espero que você respeite as minhas. 

Caio Fernando Abreu - Respeito, tanto que me calo.

Rachel de Queiroz - Pois é, se as minhas posições são constrangedoras, acho as suas também muito constrangedoras para mim. E realmente estou sendo exigida a me pronunciar sobre esses temas que eu não gostaria de ser, para não ser descortês com você, de forma que é recíproca a nossa posição.

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