Entrevista do Arcanjo: “O amor é minha língua”, diz Paulinho Moska
Músico carioca celebra 20 anos de carreira com Muito Pouco para Todos
Entretenimento|Miguel Arcanjo Prado, editor de Cultura do R7
Um mundo ideal para o cantor e compositor Paulinho Moska é repleto de amor. Em todos os níveis. Em todos os lugares.
Ele celebra 20 anos de carreira com o disco e DVD Muito Pouco para Todos, gravado ao vivo. O show de lançamento é nesta quarta (4), no Miranda, no Rio.
Artista eclético, atua em várias frentes: além do trabalho musical no Brasil e no exterior, acaba de rodar o filme Minutos Atrás e está na oitava temporada do programa Zoombido no Canal Brasil, no qual já fez dobradinha com mais de 210 músicos.
Misturando inteligência e poesia, Paulinho conversou com exclusividade com o R7 nesta Entrevista do Arcanjo. Falou sobre a carreira, a vida e sobre o que acredita.
Leia com toda a calma do mundo.
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Miguel Arcanjo Prado – Como você vê o cenário para um artista de MPB nos tempos atuais? Está pior ou melhor do que quando você começou?
Paulinho Moska – Tem duas maneiras de ver. Por um lado, quando comecei, se você não tivesse uma gravadora que te levasse para a rádio ou TV, ou se um jornalista ficasse apaixonado pelo seu trabalho e não fizesse uma matéria gigante, você não existia. Ia tocar no barzinho para amigos para o resto da vida. Por este lado era mais difícil. Porque tinha de batalhar para lotar o barzinho, para chamar a atenção de uma gravadora. E quando ia gravar um disco sempre ia ter um diretor querendo mexer no seu trabalho. Hoje, tem gente nova que por meio da internet consegue milhares de visualizações, fica conhecido e começa a fazer shows. Está mais fácil por este aspecto. Mas, por outro lado, a competição hoje é muito maior.
Você acha que a música caminha para nichos?
A palavra nicho já virou realidade, mas tem milhões de nichos se intercruzando. Às vezes, o público do Criolo pode ouvir Tulipa Ruiz e também encostar na minha música. Está aparecendo um público mais brasileiro, que gosta da nossa mistura.
Você acha isso positivo?
Hoje a música brasileira passa por uma boa fase. A gente aprendeu a ler a música brasileira por movimentos: teve a era do rádio, a bossa nova, a tropicália, a jovem guarda, a mpb dos anos 70, o rock dos 80... Já a minha geração, que é a dos anos 90, foi diferente. Eu, Arnaldo Antunes, a Adriana Calcanhotto, o Lenine, a Fernanda Abreu não éramos um movimento, não tínhamos um manifesto. O que nos unia e ainda nos une é certa admiração pela diferença que um tem do outro e não a vontade de fazer igual. E ao mesmo tempo somos uma geração. A geração que se impôs pelo diverso e não pelo movimento de uma música só.
O que é bem interessante...
Isso ajudou a música brasileira a entender mais de si própria, essa mistura de ritmos e estéticas. Acho que é um retropicalismo. O Brasil se assumiu como múltiplo: consome o Diogo Nogueira e o Sepultura ao mesmo tempo. Porque o brasileiro é diverso. Sim. E qualidade pode existir em todos os estilos. Assim como coisa ruim também. Existe jazz ruim também. A questão é ter um público com olhar múltiplo buscando a qualidade artística do trabalho do cara, o que ele quer dizer. Eu não me vejo um especialista. Eu gosto de fazer tudo. Tudo me interessa. A qualidade está dentro da gente e não em um estilo fora da gente.
Por que você mudou virou apenas Moska?
Esse foi um disco que eu fiz em 2001 e se chamava Eu Falso da Minha Vida o que Eu Quiser. Nele, trabalhava a ideia de falso sem ser oposição ao verdadeiro. O falso era a libertação do verdadeiro. Porque não existe uma verdade, Miguel. Existem verdades. A vida é explicada de maneiras diferentes e que fazem sentido de acordo com seu olhar. O mundo falso é cheio de verdades possíveis. Moska não é meu nome verdadeiro, é meu nome falso. Então, nesse disco eu assumi o Moska. Não é coisa de numerologia. Pode me chamar de Paulinho. Só nos discos resolvi assinar Moska. Eu sou os dois.
Como anda seu lado ator?
Anda muito bem. Eu acabei de rodar Minutos Atrás, um filme muito legal do Caio Soh, aqui do Rio, com o Vladimir Brichta e o Otávio Müller. É um filme muito diferente e bonito, com um texto maravilhoso. A história é interessante: são dois homens em uma carroça puxada por um cavalo em uma estrada sem fim. Eles não encontram ninguém no caminho. Durante a viagem, vão discutindo sonho, esperança, felicidade. Faço o cavalo no filme. Eu que carrego a carroça. Eu tenho um banjo que vou tocando e cantando como se fosse uma espécie de narrador.
Então tem o lado de músico junto.
Sim. Também assino a trilha junto com André Abujamra, vai estrear agora em outubro. O meu personagem não tem fala. Isso é mais difícil do que fazer com texto. Olha, eu vou te falar uma coisa: Minutos Atrás é um filme diferente, o que é muito diferente hoje em dia! [risos]
Você gravou o uruguaio Jorge Drexler antes de ele virar moda no Brasil. Você é pé quente na carreira dele por aqui? E ele na minha por lá! [risos]. Na verdade, foi um encontro maravilhoso. O Drexler é apaixonado pro Caetano, Chico, João Gilberto. Ele ama música brasileira. Gravei duas canções dele e ele me convidou para participar de shows dele no Uruguai, na Argentina, no Chile, na Espanha. Ele me apresentou um monte de músicos, como o argentino Kevin Johansen, que participa do meu DVD. Daqui a 15 dias, eu viajo com o Kevin para tocar em Mendoza, San Juan e Rosário [cidades da Argentina].
Você gravou o Drexler antes de ele ganhar o Oscar [em 2005, com a música tema de Diários de Motocicleta, Al Outro Lado Del Rio]...
Foi antes, sim. Eu gravei e ninguém o conhecia ainda por aqui. Sabe como eu conheci a música dele? Eu fiz um show na Choperia do Sesc Pompeia em 2002 e ganhei o disco dele de presente de uma uruguaia que foi assistir. Ouvi e adorei. Escrevi para ele e começamos a falar pelo telefone. Aí veio a amizade e a parceria. Foi uma aventura para mim. Minha carreira ganhou um braço internacional depois disso.
Você acha que o Brasil perde por não prestar atenção na música feita por nossos vizinhos da América do Sul?
Claro. O Brasil é meio autossuficiente em relação à diversidade. Porque são vários Brasis. Vários sotaques, comidas... Então, o Brasil se satisfaz com essa diversidade interna e, por conta da colonização, a gente fica de olho apenas nos Estados Unidos e na Europa. E esquece os vizinhos do lado... É por aí. As atitudes “portunhóis” são possíveis. E o Brasil é quem deveria dar esse abraço. Somos o país do abraço. Deve partir da gente um olhar para a América do Sul. Politicamente, eles são muito avançados. Em Buenos Aires todo dia tem piquete – se bem que, agora, estamos ficando mais argentinos [risos]. Não sei por que o brasileiro ainda tem esse preconceito bobo, que vem dessa rixa do futebol. Eu fiquei muito constrangido quando vi essa receptividade por lá e irmandade que eles demonstram por nós. Eu, de alguma maneira, tento fazer esse intercambio, já organizei dois encontros musicais sul-americanos no CCBB de Brasília. E quero fazer mais.
Você está casado? Tem quantos filhos?
Estou casada com a atriz Larissa Bracher, que faz o papel da diretora, em Malhação [Globo]. Bracher é uma família de pintores mineiros... Tenho dois filhos: Valentim, de três anos, e Antônio, de 16 anos, do meu primeiro casamento. Sou muito ligado na família. Essa coisa de viajar já diminuiu muito, porque gosto de ficar com minha família o máximo que posso.
Você também apresenta o programa Zoombido, no Canal Brasil. Como é este seu lado homem de TV?
Eu escutava muito a rádio quando era pequeno. Adorava escutar e não saber qual a próxima música que vem. Na minha ingenuidade adolescente, pensava que, aprendendo a tocar violão seria amigo de todos eles que tocavam na rádio, que o Caetano e o Gil adorariam minha música. O Zoombindo então é a realização desse sonho. Já tive 210 encontros. Como é o clima do programa? Eu não tenho a obrigação de informar o público, porque não sou jornalista, é um programa mais poético. Que tenta capturar uma atmosfera transcendental, do sonho, onírica. É meio Salvador Dalí. Eu fico praticamente calado. O programa é dedicado inteiramente ao convidado.
E você faz música com o convidado.
Eu pergunto sempre “o que é música?”. Se você perguntar para o arquiteto o que é arquitetura, todos vão dizer mais ou menos a mesma coisa. O mesmo acontece com um médico. Agora, você pergunta para o músico o que é musica, ele não sabe dizer. Eu acho isso maravilhoso! Somos seres que dedicam a vida toda a uma prática que não conseguimos explicar. Isso me dá a sensação que estamos no mundo da transcendência, da abstração. Nesse mundo louco, violento, urgente, competitivo, o Zoombido tenta ser um perfume de poesia.
O amor sempre permeia suas canções; por quê?
Olha, não me considero um cantor romântico, que é aquele que canta canções de amor quase que seduzindo a plateia. Ao mesmo tempo, o amor para mim ocupa o lugar mais importante. Porque amor é amor no mundo todo. Não tem amor diferente. Se tudo que se faz em nome de Deus você fizesse por amor, o mundo seria diferente. E o amor não é só entre o casal, é pela plantinha, pelo dia, pela vida. Se a gente não vive os pequenos instantes com amor, você olha pra trás e não valeu a pena. Eu defendo o amor, para mim é a bandeira que eu levanto e sacudo nos estádios da vida. O amor é minha língua. Eu leio o mundo com amor e faço tudo com amor. O meu trabalho, o programa, o filme, meu DVD, tudo é para melhorar a noção de amor do outro. Viver é o mergulho no nada que vai sendo preenchido por alguma coisa. Que esta coisa seja o amor.
Paulinho Moska – Show de lançamento do disco e DVD Muito Pouco para Todos
Quando: Quarta (4), 21h
Onde: Miranda (Espaço Lagoon – av. Borges de Medeiros, 1424, piso 2, Lagoa, Rio, tel. 0/xx/21 2239-0305
Quanto: R$ 50 a R$ 90
Classificação etária: 16 anos