Emocionados, vizinhos resgatam discos históricos do lixo em SP
Dono misterioso jogou centenas de LPs na calçada e provocou uma verdadeira caça ao tesouro no bairro paulista do Sumaré, na zona oeste
Música|Daniel Vaughan, do R7
No meio da semana passada uma montanha de discos de vinil foi abandonada em uma calçada no bairro do Sumaré, zona oeste de São Paulo.
A cena curiosa tomou conta das redes sociais e provocou uma verdadeira caça ao tesouro. Vizinhos e fãs de música correram para o local, sem saber quem foi o responsável ou qual foi a razão do descarte.
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Na internet, surgiram comentários de todos os tipos, enquanto fotos e vídeos eram compartilhados. Teve quem apostou em uma história trágica, onde o dono havia morrido e a família jogado fora sua coleção. Já outros, mais piadistas, diziam que haviam raridades autografadas no meio das pilhas de LPs. Mas, afinal de contas, quem é o dono?
O R7 esteve no local e descobriu que um senhor chamado Miguel, segundo moradores, costuma descartar livros, gibis e discos nessa mesma calçada da rua Bruxelas, em frente ao que seria o depósito de sua propriedade. Geralmente, ele abandona obras bem desgastadas pelo tempo ou descuido, trazendo muito mofo, capas rasgadas e riscos visíveis.
A reportagem não localizou o dono, mas vizinhos garantem que ele representa o Sebovero, que não existe mais em loja física. Ninguém soube responder o motivo do empresário não querer doar os objetos, sem jogá-los simplesmente na rua. E, pior do que isso, enfrentar uma multa e crime ambiental, com o descarte irregular de entulho.
Resgate
O que mais chamou a atenção dessa vez foi a quantidade de discos abandonados pelo comerciante. O ator e músico Theo Werneck é vizinho do local e comenta que havia cerca de dois mil LPs na calçada.
— Já achei muitas raridades na rua, mas ainda não tinha visto tantos títulos largados dessa forma.
Como o artista relatou, as peças foram empilhadas na quarta-feira (4), pela manhã, mas tudo acabou sendo espalhado conforme foram chegando fãs de música e catadores de papel.
— É cultura no lixo. Isso poderia ter sido doado, né? Mas o lado bom é que são discos que estavam abandonados e serão amados novamente. Voltaram para a vida. Eu mesmo vou tocá-los nos meus projetos de DJ.
No amontoado, Theo pegou obras de Maria Bethânia (Recital na Boite Barroco, de 1968) e Pink Floyd (Meddle, de 1971). O cantor estava lavando os álbuns no momento que a reportagem chegou e, bem humorado, confessa que achou até um trabalho do Luni, banda da qual fez parte nos anos 80.
— Agora, os discos estão novamente em boas mãos. Mas quando vi a capa do meu LP, eu gritei: "Sou eu, ali no lixo!" (risos)
Na outra esquina, o ex-baixista do Ratos de Porão, Fralda, também confirma que está acostumado com o despejo cultural do vizinho misterioso. Ele mostra que, dessa vez, salvou do lixo nomes como The Police, Toquinho, The B-52s, Bruce Springsteen e outros. Todas as capas estavam em péssimas condições, mas o disco aparentemente tocava.
— Ele simplesmente abre a porta e joga tudo na calçada! É um absurdo. Daí, você vê largado, entre mofos, bactérias e sei lá mais o quê, uma obra do Jeff Beck. Revoltante.
No dia da reportagem, Fabricio Bizu, dono do selo PsicoBR, estava lançando na rua próxima dali um vinil de Edu Viola, feito a partir de financiamento coletivo. Ele ficou surpreso com a atitude do dono do acervo.
— Eu vi as imagens no Facebook e fiquei assustado. Não é legal jogar fora uma material tão rico como esse. Se você não quer mais, faça uma doação. Vamos fazer o bem, unir pessoas que curtem música através disso.
Carla Alves, dona do brechó Devant Vintage, foi uma das internautas que denunciaram a ideia (veja vídeo acima). Ela diz que muitas pessoas chegavam até de outras regiões para resgatar álbuns.
— Postei vídeo no Instagram lamentando isso! Daí, eu vi gente vindo até de táxi para procurar o que foi divulgado nas redes. Eu valorizo a história dos objetos antigos, então, aquilo parecia uma história de terror para mim. Aqueles clássicos sendo arremessados por catadores... Meu coração ficava apertado! Mesmo se estivessem em péssimo estado, dá para reciclar como uma obra de arte. Pelo menos, muitos foram libertos para viver novamente. (risos)
E, se houver uma próxima vez, Theo Werneck faz um pedido.
— Pode chamar a gente que ajudamos a organizar! Não faça mais isso.