Timbalada arrisca inovação e fãs fazem manifesto pela volta às origens
Grupo criado por Carlinhos Brown nos anos 90 era mais percussivo; nova cantora foi vaiada
Música|Juca Guimarães, do R7

A música baiana passa por um momento de turbulência que ainda vai render muitos comentários no verão e no Carnaval. A Timbalada, um dos grupos mais tradicionais e conhecidos da Bahia passa por um momento de conflito com parte dos fãs.
Neste domingo (18), será lançado o manifesto #devolvaaminhatimbalada com planfletagem e um protesto pacífico na frente do Museu du Ritmo, onde também acontece hoje um dos ensaios do grupo para a temporada pré-carnaval. Para os fãs descontentes, ao longo dos últimos anos, a Timbalada foi perdendo sua identidade e se tornou um grupo pop.
A gota d'água foi a diminuição drástica no número de timbais nas apresentações. Além de ser o instrumento que dá nome ao grupo, o timbal, com seu som único, é uma adaptação criada pelo Carlinhos Brown, idealizador do projeto social no bairro do Candeal Pequeno, em Salvador que serviu de nascedouro para o grupo no início da década de 90.
De acordo com os fãs, que também se mobilizam nas redes sociais e em grupos pelo WhatsApps, a Timbalada fazia ensaios e shows com até 40 timbais reverberando o pancadão afro. Atualmente, são minguados dois timbais no palco.
A indignação dos fãs apareceu de forma mais aguda no ensaio do dia 4 de dezembro, no Museu du Ritmo, quando a plateia começou a vaiar a apresentação. Sobrou para a alagoana Millane Hora, cantora estreiante que divide os vocais com o cantor Denny (há nove anos na Timbalada).
Antes de entrar na Timbalada, onde conquistou a vaga em uma seletiva com cantoras de todo o país, Millane foi uma das aspirantes do programa The Voice, da Rede Globo, e fez parte do time da cantora Cláudia Leitte.
No ensaio de apresentação para o público, que deveria ser a realização do sonho da cantora, os fãs exaltados vaiaram até que ela saísse do palco. A cena foi só mais um capítulo da ampla campanha dos fãs antigos da Timbalada, que autodenominam timbaleiros e timbaleiras.
Os fãs também elencaram em 12 tópicos os problemas com a direção do grupo e as mudanças dos últimos anos. Entre os pontos destacados estão os preços dos ingressos nos ensaios (R$ 80), a truculência dos seguranças, a retomanda do timbal como instrumento principal e a volta de músicas antigas para o repertório.
Outro ponto que gerou ressentimento nos fãs, principalmente após a decisão do Carlinhos Brown se afastar do grupo há quase dez anos, foi o distanciamento com a direção da banda. Hoje a empresa Timbalada é gerida pelo Gilson Freitas, irmão de Carlinhos Brown.
"Quem é Timbaleiro como eu, encontrou domingo no museu do em vez de uma Timba percussiva e vibrante, uma banda pop, cantando em inglês e distante de seu repertório tão rico", disse uma fã.
A revolta dos timbaleiros, como já é chamado o movimento dos fãs, foi endossada por ex-integrantes e vocalistas que não gostam da mudança no som e na identidade da banda. A cantora Patrícia Gomes, que cantou por nove anos na Timbalada (1991 a 1999) disse: "Amo a Timbalada. Ali foi a minha escola e fico muito triste com tudo isso".
O vocalista Ninha, referência na fase de sucessos da Timbalada e que era chamado de "gogó de ouro" pelo Carlinhos Brown, evita falar sobre o ex-grupo. "Estou proibido pela minha assessoria de falar sobre a Timbalada. Isso já mudou e é passado. Agora estou concentrado na minha nova banda a Trem de Pouso que vai lançar logo depois do Carnaval", disse o cantor que ficou 15 anos na Timbalada.
Preconceito
A reação radical dos fãs contra as inovações da Timbalada foi interpretada como preconceito pela imprensa porque a cantora
Millane é loira e não é da Bahia. O grupo de fãs que criou o movimento descarta essa versão. "Não temos problema com a miscigenação, pelo contrário a valorizamos. A grande questão é que essa miscigenação, não pode tirar os valores culturais, identitários e de pertencimento da mesma. Não vemos problema com a Timbalada misturando as etnias, símbolos ou ritmos. O que pedimos enquanto fãs e seguidores da banda, é que essas misturas não desconstrua o legado", disse Elisa Bastos, timbaleira há mais de 20 anos como gosta de frisar.
Entre a centenas de integrantes que fizeram parte da Timbalada em quase trinta anos de carreira um exemplo de miscigenação foi o vocalista Akira Takakura, nascido no Japão, e que foi muito bem recebido pelos fãs.
Outro lado
Por meio da assessoria de imprensa da Timbalada, Gilson Freitas disse que não vai se posicionar sobre o protesto dos fãs. A assesoria disse, porém, que o grupo está sempre buscando o melhor para os fãs e espera que "logo tudo fique bem". A Timbalada informou ainda que a vocalista Millane não saiu do palco dia 4 e "continuou sua apresentação como estava previsto no script do show, com normalidade".
O cantor Carlinhos Brown, que estava no dia do ensaio e foi o mestre de cerimônia da apresentação da Millane, foi procurado pelo R7, mas não quis comentar os desdobramentos da mudança musical da Timbalada. A assessoria do cantor e jurado do programa The Voice, da Rede Globo, disse que ele está concentrado no lançamento de um novo projeto musical.
No próximo dia 30, durante um show de pré-Réveillon em Salvador, Carlinhos Brown vai apresentar a banda Mukindala, que aposta no merengue percussivo para dar vida a diferentes linguagens rítmicas, com foco no parambandam, ritmo caribenho, instrumentalizado no bairro Candeal, local de nascimento e berço criativo de Carlinhos Brown. O novo grupo percussivo afro-brasileiro traz na sua formação oito músicos e dois vocalistas, de performances divertidas e vozes potentes, Paula Sanffer e Rafa Chagas, ambos ex-participantes do The Voice. A eles, na linha de frente, soma-se o percussionista Gato Preto, que tem um estilo todo próprio de tocar guitarra.