HQs independentes fazem sucesso entre colecionadores e artistas
Ugritos são curtos, marcantes e conseguem unir novos artistas e também quadrinistas renomados.
Refúgio Geek|Do R7
Até o momento já foram lançados 16 volumes da coleção Ugritos. Todos seguem um padrão: 16 páginas, história em preto e branco e formato de bolso. E entre esses 16 volumes existem muitas diferenças de estilo, desenho e também de narrativa, cada um tem sua personalidade e características bem diferentes. Por exemplo, “Culpa” que foi escrito e desenhado por Cristina Eiko é um quadrinho com traço leve e que remete a lembranças de infância, coloca o leitor para pensar. Já "Incontinência Tripária" de Victor Bello é uma história com o traço bem solto e que te faz rir do começo ao fim. Os quadrinhos são lançados a cada dois meses.
“O legal da coleção Ugritos é que embora seja periódica, cada uma delas pode ser lida individualmente, então dá pra ser lida por quem é fã de uma autora ou autor só na coleção toda. Eu particularmente sou do time que coleciona os Ugritos, e fico muito feliz de saber que vai ter um próximo de alguém que vai me surpreender”, afirma Cristina Eiko.
Douglas Utescher é um dos sócios da Ugra Press, a editora responsável pela coleção. Ele conta que a seleção dos artistas que vão participar da iniciativa é feita por pessoas que amam quadrinhos. “Tem apenas um critério na hora da escolha do artista: A gente só escolhe quem a gente gosta muito do trabalho. Tem um lance também de satisfação pessoal, tem um pouco do lado fã. Mas tem gente que vem conversar com a gente e acaba dando certo também”, explica Douglas.
A Ugra é também uma loja de quadrinhos muito conhecida por valorizar os artistas nacionais e vende quase tudo que é publicado no Brasil no cenário independente. E por isso tem seu reconhecimento no meio dos quadrinistas.
“A Ugra é um oásis para os leitores mais atentos. Prezo muito a figura do livreiro e do ponto de encontro para artistas e leitores. Uma livraria como a Ugra é um organismo vivo, que promove eventos, debates, conversas. São valores que nem sempre são percebidos com tanta clareza pelos leitores, que muitas vezes dão prioridade aos descontos das grandes redes”, revela o quadrinista Thiago Souto.
Thiago Souto é responsável pelo volume número 5 da coleção “Time Lapse”, e particularmente, um dos meus preferidos. A história mostra o encontro de um homem com uma versão mais velha dele mesmo. É muito complicado falar de uma dessas edições, elas são curtas e qualquer spoiler pode acabar com a experiência do quadrinho. Isso também acaba sendo um desafio na hora de criar a história. “A maior dificuldade é a de colocar apenas o essencial para que a história seja entendida. Trabalhar com esse formatinho me fez usar menos painéis e texto, então, de certa forma, a leitura também fica mais rápida. Causar algum tipo de emoção nessas condições é bem desafiador, revela Thiago Souto.
Juscelino Neco que desenhou e escreveu “Cadeado”, o volume 10 da coleção, também teve a mesma dificuldade “Logo de saída eu decidi que teria uma divisão regular de quadros e, devido ao formato, coloquei no máximo duas vinhetas por página. Como o gibi só tem 16 páginas foi realmente um grande exercício de concisão. Normalmente eu utilizo longos diálogos nos meus quadrinhos e nesse caso também tive que optar por uma narração mais intimista, conta Juscelino.
Já para Ricardo Coimbra o desafio foi diferente, ele está acostumado a criar tirinhas, bem mais curtas que as 16 páginas do volume 7 da coleção. “Fired” é a história de um homem que tem um cargo alto no trabalho e que acaba se tornando agressivo. “O tamanho da página pra mim nem alterou muita coisa na criação, era só uma coisa de proporção mesmo. Criei no tamanho normal em que desenho, tamanho A4, apenas tomando o cuidado para não colocar detalhes muito pequenos no desenho, que não apareceriam na diminuição, ou fontes muito pequenas que atrapalhariam a leitura”, conta Ricardo Coimbra.
Mesmo com dificuldade o projeto chamou muito a atenção do desenhista “Li muito gibi de bolso durante a minha vida, Tex, Mafalda, Dilbert, Fantasma, Zéfiro e sempre sonhei em criar um. Acho sensacional essa coisa de poder levar pra todo lado, como uma minibíblia ou aqueles livrinhos Minutos de Sabedoria, lê um pedacinho ali esperando o ônibus, põe no bolso, lê um pouquinho depois no balcão da padaria. Acho um formato popular, interessante, que se mistura à vida comum das pessoas, passa a fazer parte, faz companhia mesmo, finaliza Ricardo Coimbra.
Acredito que a iniciativa da coleção consegue com muito sucesso aproximar o leitor de quadrinistas nacionais, que fazem um ótimo trabalho. Além de ser curto, têm um preço bem acessível e pode ser encontrado apenas em comic shops: Comix, Comic Boom e Ugra, aqui em São Paulo.
Para quem produz os Ugritos é questão de tempo para a coleção ganhar um público maior e merecido. “Falta conquistar um público novo e diferente do habitual de quadrinhos, aquele que não se identifica nem com mangá nem com comics e que ainda não sabe que tem quadrinhos nacionais com o qual pode se identificar, autobiográfico ou não, humor escatológico, fofo, LGBTQ+, feminista, enfim, de todo tipo”, afirma Cristina Eiko.
Mas iniciativas como essa do Ugritos ajuda também a popularizar os quadrinhos como explica Ricardo Coimbra “É um alento a existência da Ugra, que, apesar de estar num circuito independente, faz tudo de forma bem profissional, valorizando os autores e dando uma atenção especial à divulgação e distribuição, na medida do que dá para uma editora pequena fazer. Quando se fala de quadrinho, a gente pensa muito em autores, mas o trabalho do editor, de fazer uma boa curadoria, publicar, distribuir e divulgar é essencial”.
Tenho certeza que nesses 16 volumes existem histórias para todo o tipo de público, e que em algum momento, os leitores vão se aproximar e conhecer melhor o que está sendo feito na Ugra.
“A produção nacional está em um momento incrível, com gente muito jovem e talentosa, mas a circulação desses trabalhos ainda é muito restrita. Ainda falta visibilidade”, encerra Thiago Souto.
Confira a lista completa da coleção:
Volume 1 – Cru, por Chico Felix
Volume 2 – Germes, por Cynthia B.
Volume 3 – Bastião da Justiça, por Dw Ribatski & Gabriel Góes
Volume 4 – Furiosas, por Rafa Campos
Volume 5 – Time Lapse, por Thiago Souto
Volume 6 – Seleção Natural, por Marcatti & André Pijamar
Volume 7 – Fired, por Ricardo Coimbra
Volume 8 – A mediocrizaçao dos afetos, por Fabiene Langona, A Chiquinha
Volume 9 – O retorno, por Pedro D’Apremont
Volume 10 – Cadeado, por Juscelino Neco
Volume 11 - Culpa, por Cristina Eiko
Volume 12 – Arrecém, por Diego Gerlach
Volume 13 – Le Monstree, por Galvão Bertazzi
Volume 14 – Roomates Móbida Diferença, por Bruno Maron
Volume 15 – Incontinência Tripária, por Victor Bello
Volume 16 – Ruído, por Paulo Crumbim
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Ugra - Rua Augusta, 1371 - loja 116 - Consolação, São Paulo - SP