Novo livro mostra força do jornalismo em quadrinhos no Brasil
Histórias reais e com temas pesados são contadas com a ajuda de desenhos; A HQ Raul, recém-lançada, é um ótimo exemplo do gênero
Apuração HQ|Cauê Teixeira
Um garoto de um bairro pobre que sonha ser um astro do rap, para subir ao palco é preciso ter atitude, mas como muitos meninos que vivem nas favelas o crime está sempre presente. Na vida de Rafa não foi diferente, os golpes em agências bancárias eram tão frequentes quanto as músicas. O golpe é quase invisível e na quebrada é chamado de "Raul", ficou popular entre os criminosos por não ter vítima... funciona assim: cartão clonado, saque na agência, cliente reclama com o banco e o banco devolve o dinheiro.
Segundo, De Maio a linguagem visual passa tanta informação quanto o texto "Existem vários desafios nesse livro as pessoas não tem rosto para falar um pouco sobre a invisibilidade e mostrar que a estamos numa sociedade que a pessoa se perde num mundo de violência." Finaliza.
Entre altos e baixos a vida de Rafa, nome fictício, foi retratada num livro reportagem em formato de quadrinhos pelo artista e jornalista Alexandre de Maio. Durante a apuração o jornalista passou vários dias com o personagem da história e conheceu toda sua rotina e ouviu suas histórias. O livro tem mais de 180 páginas e foi publicado pela Editora Elefante. "Eu usei o gancho do jornalismo. Se você tem uma história incrível, você já tem uma história incrível eu só tentei não estragar muito ela." brinca, De Maio.
Apesar de ser uma grande reportagem o livro é de fácil leitura e muito dinâmico. O leitor passeia por lugares conhecidos de São Paulo, como a galeria do rock, no centro da cidade. Além da história do personagem é possível entender um pouco do sistema carcerário do país. Falta estrutura, espaço, comida e quem vive lá é tratado como lixo. A crítica social está sempre presente nos trabalhos de De Maio.
A arte não pode ser considerada nova, mas caminha a pequenos passos aqui no Brasil.
"Assim como o jornalismo literário, no começo, essa técnica busca novos espaços e nasce para ajudar os quadrinhos a retratar a realidade… e o jornalismo a alcançar novos públicos e tornar a compreensão mais atrativa em tempos de bombardeios visuais" Afirma, Alexandre de Maio.
Os quadrinhos sempre foram tachados como leitura para crianças, mas isso deixou de ser verdade absoluta há muito tempo. Muitas histórias reais já foram mostradas nesse formato e fizeram sucesso mundial. Uma das publicações mais famosas se chama Maus do quadrinista Art Spiegelman, a história em quadrinhos foi a primeira a ganhar o Prêmio Pulitzer de jornalismo.
Maus mostra como um judeu polonês sobreviveu ao Holocausto. Spiegelman construiu a história entrevistando o pai dele e desenhando tudo que ele viveu. Para amenizar e tirar um pouco do peso da narrativa bem triste, Spiegelman usou animais para retratar as diferentes etnias: Judeus são ratos, nazistas são gatos, franceses sapos, americanos cachorros e os poloneses são porcos.
Will Eisner também contribuiu muito para o estilo: ele era especialista em crônicas, mostrava o cotidiano na visão de um quadrinista, mas ainda sem a apuração de um jornalista.
Mas o artista Joe Sacco é considerado o "pai" do jornalismo em quadrinhos, ele foi o primeiro a publicar grandes reportagens neste formato e abordando temas de guerra. Formado em jornalismo viaja o mundo em busca de história. Vivendo o cotidiano da guerra e dentro das trincheiras escreveu e desenhou Palestina, Sacco tentou mostrar os dois lados da guerra de palestinos e israelenses, algo que a mídia ocidental não costuma veicular. Ele ainda concluiu o trabalho com outro livro "Notas sobre Gaza".
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