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DE DOGVILLE A MAD MAX – NUNCA AO CONTRÁRIO

Até onde sei|Carmen Farão

Christine Lagarde, diretora-gerente do FMI na foto de capa. Pareceu-me simples, fácil e nem tão distante uma conversa. O ângulo da foto, a expressão do olhar ou a boca um pouco torta fraseando alguma coisa relativa e completamente importante. A verdadeira nova onda marolada no Vale do Silício traz interpretações peculiares. Fotos sobre fotos sobre fotos sobre fotos... take a take. O que flagrante técnico e profissional agora está nas mãos de quem possui um bom smartphone, a um dedo de mudar a história de famosos e antigos anônimos. Digo antigos porque não o são mais. Melhor adjetivarmo-nos como “ainda não descobertos” ou “desinteressante por ora”.

Sou um rastelo na internet e o era antes nas bibliotecas das escolas que frequentei. Houve uma época fotos de autoridades não deixavam dúvidas do seu querer de importância: queixo ao alto, olhar distante, ou, se para a lente, severo e autoritário como toda robustez que nos tempos aqueles deveriam ter. Aquelas fotos ovaladas, sombreadas prontas para cortar do jornal e ir para parede. Não havia instantaneidade nos instantâneos. Posava-se com enorme gabardia e arrogância do menor ao maior poder. Bastava uma gravata e um bom pente nos cabelos. Eles (sim, eles, geralmente homens) deixavam marcados para a eternidade a imagem que vendiam ou queriam ver compradas.

Hoje, quando as imagens viajam pelo mundo replicando-se quase à velocidade da luz, vemos línguas para fora da boca, no molhar dos lábios, a sobrancelha erguida ou serrada e expressões até de Christine Lagarde. E a sensação de descontinuidade cai por pixels. Parece que posso tomar um cafezinho com ela. Virar pro Trump abrindo os braços e falar de boas: "qualé, cara?!".

No twitter sou quase da família da Shonda Rimes. E de um cantor folk que até me respondeu um "rái, Brazéél". Ouvi o som dele, gostei, adicionei, elogiei e "rái, Brazéél". Não mais distante. Alicya Keys perguntando o que eu diria para minha criança hoje. Respondi. Se ela leu nas centenas de milhares de respostas, não sei. Mas ela nunca esteve tão perto. Essas respostinhas também são as tais mensagens na garrafa que redundo no mundo redondo. Isso talvez não mude. A forma do mundo. Redondo. Tenho minhas dúvidas.


Esse e-book aberto é fermento de pauta, pedido de emprego, revolta anunciada, direito de resposta que não sabemos usar. Somos constantemente levados a mudar o foco e também a lente que enxerga e colore a cena.

Lars Von Trier não é uma pessoa otimista com relação às pessoas e deixa claro em seus filmes o que ele considera compõe a natureza humana. Somos todos habitantes de Dogville. Num outro filme, revisto recentemente, ele imprime através da personagem principal: "A sociedade é feita de hipócritas que não são preparados para a democracia". Por mais que minha ética cristã e fé inabalável nos ensinamentos de meus pais urjam ao contrário, essa fala tocou fundo. Não estar preparado para o que nos é oferecido. Diáspora eterna. A despeito de todas as exceções, somos facilmente manobrados, direcionados e redirecionados. Pequenos delitos e desejos secretos, cobiças e "invejinhas brancas" (nunca soube exatamente o que é isso. Inveja é inveja e é um dos pecados). Podemos assumir que queremos o que o outro tem sem medo ou culpa de estar pecando. É normal. Esse afogamento regurgitante de palavras que nunca são ditas são combustível para nossa provável "natureza humana cruel". Somos bilhões. Entre bilhões, poucos líderes se levantaram contra a violência e conseguiram mobilizar multidões. Também a maioria surgiu durante o século XX. Ele todo. Da mesma forma me impactou a foto Flower Power, com um jovem colocando flores nas armas dos soldados durante um protesto contra a guerra do Vietnã em Washington. 1967. 50 anos se foram. As flores continuam frágeis e os jardins cada vez mais raros. As armas continuam cuspindo belicismos dos piores modos e formas contra alvos desavisados. Violência que se departamentaliza, oficializa. Saindo de DogVille, aquele mundo cão, caímos no deserto Mad Max sem dono nem busca.


Ouço muitos desanimados sem sonhos e esperanças. Não há saída, parece. Qualquer alternativa leva ao mesmo lado da força. O que antes era claro, não é mais. Gerações inteiras com tanto à oferecer pasmadas diante de narrativas inacreditáveis.

Talvez, quando quem pode mudar a vida de uma pessoa o fizer positivamente, com um gesto que nem sempre lhe custa algo e é tão importante para o outro. Talvez a esperança desse outro transborde em otimismo, respingue e benza mais outro e a vontade da esperança retorne, e com ela a força para o bem. Sem que o “bem” pareça tolice, bobice de quem não caiu nas garras políticas corporativistas por falta de educação assertiva. É o “bem”. Não é preciso ser sempre “bom” para fazer o bem.

Os textos aqui publicados não refletem necessariamente a opinião do Grupo Record.

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