Uma sopa de pedra pode afagar os sentidos
Até onde sei|Gabriel Kwak
Uma sopa de pedra pode afagar os sentidos. A fábula da sopa de pedra, muitos de vosmecês já devem tê-la ouvido.
Com uma variante aqui e ali de versão para versão. Essa sopa matou a fome de muita gente, alimentada de fantasia e dos outros ingredientes que se somaram à receita.
O segredo evidentemente não era a pedra e essa estória é muito empregada como uma narrativa motivacional.
Uma pesquisadora de cultura popular de alto tomo, a veterana escritora Ruth Guimarães - a quem muito reverenciei por com ela ter convivido e infelizmente falecida neste aziago ano de 2014 -, recolheu em suas andanças muito de história oral.
Os livros dessa discípula de Mario de Andrade são uma mina de lendas folclóricas, sobretudo do Vale do Paraíba. Seu livro de 2006, Calidoscópio - A Saga de Pedro Malasarte recupera algumas variações desta fábula.
Eis uma delas:
"Pedro ia andando por um caminho e sentiu muita fome. Catou umas pedras brancas, de cristal, lavou bem e levou para uma velha cozinhar. É para fazer uma sopa. E como é que se faz? Coisa fácil demais, sá dona!
Refoga as pedras com tempero e sal com alho, cebolinha verde, tomate. Garra um punhado de macarrão, umas batatas, meia dúzia de ovos, uns pedaços de toicinho e de pele de porco, mistura tudo, deixa ferver, deixa cozinhar. E pronto. A mulher fez. Tudo em ordem.
Pedro, só o que tem é que as pedrinhas estão duras. Não tem nada, não, sá dona! Eu como assim mesmo. Bateu bem pra dentro dois pratarros da sopa de pedra, largou as pedrinhas na panela e foi embora, que já estava na hora do homem dela voltar da roça.
Quando o marido chegou, que ela contou tudo, tintim por tintim, ele falou: 'Mulher burra! Já foi na onda do Pedro!'" (p. 114)
O próprio Câmara Cascudo também registrou em suas pesquisas a lenda da sopa de pedra. Todo o mundo aumenta um ponto desse causo, ao longo das gerações.
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