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Keila Jimenez - Blogs

Nem eu nem Gabo queríamos ver 'Cem Anos de Solidão' na TV

Será que a premiada obra de Gabriel Garcia Marquez vai sobreviver ao ser transformada em série pelo serviço de vídeos on demand?

Keila Jimenez|Do R7 e Keila Jimenez

Javier Bardem no filme "O Amor nos Tempos do Cólera"
Javier Bardem no filme "O Amor nos Tempos do Cólera"

Eu tinha 14 anos quando li ' Cem Anos de Solidão' pela primeira vez. Tava de bobeira fuçando na coleção de Jorge Amado do meu pai quando encontrei o livro de capa branca com uma mão azul na frente e título curioso.

O velho me avisou que a história era um tanto confusa para quem não tem facilidade de gravar nomes.

Mas logo estava presa vivendo entre os Aurelianos, Buendías, Josés Arcádios, Remédios e Amarantas.

Criei raízes na história, assim como a casa que presenciou a trajetória sofrida dos personagens de Gabriel Garcia Marquez, Gabo, para os mais íntimos. Afinal, depois de ler a obra completa do colombiano, me sinto íntima dele.


A chuva que não parava e as borboletas amarelas não saíram da minha cabeça desde então. E voltei a reler 'Cem Anos' mais duas vezes ao longo da vida. 

Sabendo da minha paixão pela obra, não demorou para alguém me mandar a notícia da vez: que meu livro preferido iria virar série da Netflix.


Foi um baque. Tenho medo de adaptações do que considero perfeito em forma e conteúdo.

Se for uma 'releitura' então, eu passo, sem medo de perder nada.


A certeza de que o serviço de vídeos on demand pode destruir o realismo fantástico de Macondo como um estouro de barragem preencheu meu coração.

Ok, esta será a primeira vez em 50 anos que o clássico da literatura latino-americana, lançado em 1967, será adaptado em formato de vídeo! Mas isso só me assusta ainda mais!

Lembrei que o autor dizia que 'os filhos herdavam toda a loucura dos pais!", como eternizou no livro. Mas ele errou. Filhos têm suas prórias loucuras!

Rodrigo Garcia e Gonzalo García Barcha, filhos de Gabo, serão produtores executivos do seriado. Foram eles que venderam os diretos do livro para a gigante Netflix, coisa que o pai evitou durante toda uma vida.

Gabo tinha receio de transformar sua obra em filme, série, novela...

Lembrei da decepção que senti ao ver o poético 'O Amor nos Tempos do Cólera' resumido a drama ruim de 'Sessão da Tarde', mesmo com os maravilhosos Javier Barden e Fernanda Montenegro no elenco.

Se a dor de um amor platônico de toda uma vida foi toda perdida ao passar para telona, o que a TV fará então com a história de um século de vida da família Buendía?

Será que a obra-prima digna de Prêmio Nobel sobreviverá ao poder das imagens que até então só viviam na mente dos que acreditam em tudo, como Gabo dizia ser?

Desde sua publicação, em 1967, "Cem Anos de Solidão" vendeu cerca de 50 milhões de cópias e foi traduzido para 46 idiomas.

Gabo, que se hoje fosse vivo teria 92 anos, se assustava com a popularidade de 'cachorro-quente' da obra, mas gostava da ideia de milhões de leitores imaginando os personagens e os cenários como desejassem. Dizia que o realismo mágico, por mais descritivo que fosse, era libertador nesse sentido.

Sempre pensei nisso.

O meu Coronel Aureliano Buendía, o que vive na minha mente desde a primeira leitura, já foi alto e peludo, baixo e cadeirudo, mouro e com as mãos grandes.

Da próxima vez que reler o livro, Buendia será outro, melhor que a mais perfeita das escalações poderia me dar. Agora temo vê-lo na sala de casa, com o rosto emprestado do Ricardo Darín, ou de qualquer um que aprisione para sempre a liberdade que Gabo e eu presávamos.

Os textos aqui publicados não refletem necessariamente a opinião do Grupo Record.

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