Marketeiros e suas estratégias
Cottonbro/PexelsSegundo um marketeiro político – com vasta experiência em campanhas para candidatos que só ganham eleições com muita publicidade para esconder quem realmente são – a mente dos piores políticos passa por quatro fases diferentes.
Essas fases se iniciam durante a campanha e vão mudando assim que o péssimo político se elege e inicia seus desmandos, quer dizer, seu mandato. A primeira delas é a da Humildade, que só acontece durante o período de propaganda política. O marketeiro explica:
“Nesse momento a gente convence o cara de que ele é um sujeito do povo. Pode parecer difícil, porque ele acredita piamente que é um ser superior e predestinado a ser servido pela ralé, mas isso fica fácil quando se usa a estratégia correta. Eu não vou pelo caminho de fazer o cara entender que terá uma responsabilidade enorme, que vai ter que trabalhar dia e noite pelo povo, que a imprensa vai cair matando em cima e blá-blá-blá. Isso aí desanima qualquer um!”
Realmente, falar em trabalhar muito, ser massacrado pela imprensa e ainda por cima em benefício dos outros não é nada animador. E não é que a estratégia já começa a fazer sentido? O marketeiro continua:
“Eu digo que ele vai voltar a ser criança e vai poder fazer de conta que é o menino mais legal do bairro, aquele que vive sorrindo, que ajuda a mãe em casa, que empresta os brinquedos e que as vizinhas gostariam que fosse filho delas. Às vezes o cara fala ‘não, peraí... eu nunca fui assim, eu era uma peste!’, mas a gente lembra que é só um faz-de-conta, pra ele não se preocupar e tal. É assim que a gente consegue por o cara na rua disposto a abraçar gente suada, pegar bebê melequento no colo, entrar em ônibus, comer pastel, coxinha e pão com mortadela na periferia.”
Mas não se engane achando que tudo é tão fácil assim. Segundo o marqueteiro, é preciso criar uma estrutura enorme para garantir a integridade física do mau candidato. “É óbvio que ele nunca foi para a rua de verdade. Então, ele não tem anticorpos para resistir ao contato físico com o povão. Daí, a gente tem que selecionar as pessoas com quem ele vai interagir”, confidencia o publicitário e completa:
“Os ônibus nos quais ele vai entrar fingindo intimidade com o transporte público têm de ser devidamente esterilizados. Os figurantes que vão fazer o papel de passageiros também são previamente escolhidos e meticulosamente higienizados. Agora imagina o trabalhão que dá quando a gente leva o cara pra Cracolândia? É complicado produzir cenas tipo “Walking Dead” sem a estrutura de Hollywood.”
De fato, deve ser um desafio e tanto, ainda mais porque essa é apenas a primeira fase. Aliás, é justamente por conta do desgaste da fase 1 que a fase 2 é mais tranquila de ser administrada, como o publicitário conta:
“A fase 2 é levar o cara – já eleito – a outro extremo, da Humildade para o Orgulho. Essa é super simples: basta elogiá-lo dia e noite falando: ‘meooo, você é o cara! Você tem o mundo aos seus pés!’ Também pagamos milhões para a imprensa publicar as mesmas bobagens que dizemos para ele. Colocamos o cara nas capas das revistas numa pose do tipo “sou o salvador da humanidade” e aí o povo pira, tem que ver! As pessoas acreditam mesmo, é surreal!” comemora o publicitário e acrescenta:
“Mas o que interessa é fazer o meu cliente esquecer as humilhações que passou durante a campanha e acreditar que pode fazer tudo o que quiser, afinal de contas, não precisa mais do povo para nada. Ele só não pode esquecer que deve tudo a mim.”
É aí que o markteiro deixa a fase 3 acontecer: a Tirania. Ele explica que a transição é orgânica, pois nada mais é do que uma consequência do Orgulho. “Uma vez que o cara se acha o top das galáxias, começa a fazer tudo quanto é idiotice, assim como qualquer tirano ao longo da história. A essa altura eu já lucrei uma fortuna com o paspalho e não estou nem aí pra nada, então eu o deixo fazer papel de trouxa. Faz parte da minha estratégia para ser contratado para a próxima campanha e lucrar ainda mais”.
O marqueteiro conta que, depois de tomar inúmeras decisões estúpidas que só prejudicaram a população, o tirano acaba caindo sozinho na fase 4, a Depressão. “Lá pelo terceiro ano de mandato, o tirano sai às ruas e percebe que não é um deus. Ao contrário, ele é odiado, xingado e precisa correr de volta para o seu palácio com o rabinho entre as pernas. Deprimido, ele lembra que a mamata está acabando e que vai precisar de mim para voltar a ser o deus de antes. Só na fase 4 é que a gente consegue fazer o cara voltar à fase 1, a da Humildade. Daí para frente é só recomeçar o ciclo, porque enquanto o tirano está viciado no poder, o brasileiro não tem memória e vai votar no babaca de novo!”
Esta crônica é uma ficção, mas poderia não ser.
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