O álbum que traduz o caos urbano em poesia sonora: Onga Rupestre, Laika Não Morreu e Gisele Lira equilibram fúria, ternura e groove num só respiro
“Mantendo o Equilíbrio” traz hip hop, rock e jazz-pop em sintonia para quem transita entre eventos culturais, batalha de rima e pista na mesma semana.

Há discos que chegam como manifesto; outros, como rito de passagem. “Mantendo o Equilíbrio” é os dois. O encontro do rapper Onga Rupestre com a banda Laika Não Morreu! — e participação da ex-The Voice, Gisele Lira — entrega quatro faixas que misturam hip hop, indie rock, jazz-pop e brasilidades sem pedir licença. E, ao mesmo tempo, marca a despedida de Gisele do grupo que ajudou a moldar o timbre da Laika nos últimos anos. Momento limiar: uma celebração com gosto de adeus.
De onde vem essa soma
A Laika Não Morreu! nasceu em 2018 como banda de groove rock com veia eletrônica, atravessou a pandemia morando junta e saiu do isolamento com uma formação focada em energia, cor e dança. A história recente carrega lastro: concursos da Kiss FM e EM&T, selo Analaga (do produtor Dudu Borges), 3º lugar no Festival de Rock de Indaiatuba 2023 e elogios de nomes como Tarja Turunen e Paulo Baron. O nome em homenagem à saudosa pet Laika, o “ser vivo que fez o que nenhum homem teve coragem de fazer”, é uma ética de risco calculado.
Onga Rupestre, por sua vez, vem da cena rap alternativa de Diadema-SP, um berço do hip hop, com boa vivência de palco e parcerias de peso. O olhar de cronista de rua encontra, aqui, encontrou uma banda que sabe jogar com dinâmica de show: quando segurar e quando é hora de estourar.
Já Gisele Lira, que conquistou o público durante sua participação no reality The Voice Brasil 2018, traz a ponte que leva o som ao público de MPB/R&B. A voz brilhante e de ótimo ataque melódico costura refrões e dá contraste ao grão da fala de Onga. É também por isso que este lançamento soa especial: é o último capítulo dela à frente da Laika, um registro de passagem que vale por documento.
O EP, faixa a faixa
“Filé da Borboleta”
Instrumental com perfume rock 80’s, cama R&B e rap frontal. O dueto Onga–Gisele é a chave: ele dá chão rítmico; ela, brilho e sustentação harmônica. Há imagens boas (“grafites”, “plantas”, “Jah”), e uma levada das mais atraentes do EP. A faixa fala de autocuidado e comunidade. Musicalmente, baixo com corpo e uma base quase em looping que seguram bem o clima sem virar pastiche.
“Kinem Danone”
Abre em guitarra funky, puro swing funkadelic, bateria presente, flow com atitude. É o recorte mais “rua-cinema”: shopping, Ramones, juliet, milk-shake, humor de observação que funciona. A entrada de Gisele no refrão puxa o rock e cria um call-to-action natural — “tá tendo”. A banda se destaca pelo feeling primoroso, o rap respira e os punchs aparecem mais cortantes. É também onde a Laika mostra a mão virtuosa sem cair no “overplaying”.
“Jornadas”
A mais eletrônica/experimental. Beat mais dançante, melodias de Gisele orbitando a canção brasileira, guitarra textural. A letra mira alto: cosmos, pertença, fome e dignidade — “descascando cobre pra ter o que comer na mesa”. O contraste entre pista e contemplação dá o tom do título do EP: equilíbrio.
“Aconchego”
Violão de nylon, sopro e dueto em modo afeto, lembrança de MPB moderna com toques eletrônicos discretos. O rap entra como conversa, não como choque. Imagens simples (“café na mesa”, “açúcar mascavo”) que funcionam porque soam verdadeiros. É a faixa que fecha a narrativa lembrando que a dureza da rua pede também colo.
O que esse encontro diz sobre eles
O EP humaniza a tríade. A Laika aparece como banda que sobreviveu à clausura e aprendeu a dançar o silêncio; Onga, como letrista que sabe alternar crônica, mística e humor; Gisele, como ponte estética que garante melodia com personalidade e que se despede deixando assinatura clara. Esse álbum realiza uma rara costura: rap com banda que não soa como “conjunto de casamento” nem “rock com um MC por cima”. Soa "grupo".
Por que importa (e para quem)
“Mantendo o Equilíbrio” mira um cruzamento que atende a quem está órfão nas prateleiras: jovens urbanos que transitam entre rap e MPB moderna, com forte presença feminina; gente que frequenta Sesc, batalha de rima e pista alternativa na mesma semana. Para esse público, a proposta de “correria por fora, aconchego por dentro” faz sentido imediato.
Também é um registro histórico da fase final de Gisele na Laika. O adeus não vem como ruptura dramática, mas como capítulo bem fechado, o suficiente para deixar saudade e, ao mesmo tempo, liberar ambos para a próxima página.
No fim, “Mantendo o Equilíbrio” promete o atrito entre concreto e planta, pixação e café. Cumpre bem seu papel, com a coragem de quem sabe que despedidas também são formas de começo.
Escute o EP “Mantendo o Equilíbrio” em todas as plataformas digitais pelo link abaixo:
https://bfan.link/mantendo-o-equilibrio
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