Como mudar o que não muda nunca para lidar com o que muda a todo momento
Como se preparar para o futuro, lidar com riscos e aproveitar oportunidades para uma vida melhor. A resposta está no passado?

Você sabe como surgiu a expressão “vacas gordas e vacas magras”, que indica momentos de abundância e escassez? Entre 1650 e 1550 a.C., durante o período dos Hicsos no Egito, um príncipe hebreu chamado José foi vendido pelos próprios irmãos a uma caravana de ismaelitas que o revendeu ao capitão da guarda do faraó.
Sem saber qual seria seu destino naquele lugar distante, com cultura e idioma completamente diferentes dos seus, José protagonizou a improvável trajetória de escravo a governador de toda a terra do Egito ao sugerir ao faraó que armazenasse a quinta parte das colheitas durante os sete anos de vacas gordas para suprir a escassez dos sete anos seguintes, os de vacas magras.
Essa fórmula, implementada há mais de 3.600 anos, é um exemplo claro de algo que continua funcionando até hoje, mesmo em um contexto histórico radicalmente distinto e com tecnologias incomparavelmente mais avançadas. Como afirma a filósofa Lúcia Helena Galvão: “O homem que guiava uma biga é o mesmo que hoje pilota um jato; mudaram as ferramentas, não o ser humano.”
Essa é também a tese central de Morgan Housel em O Mesmo de Sempre – Um guia para o que não muda nunca (Editora Objetiva). O autor parte do princípio de que, embora tecnologia, cenários, culturas e geografias mudem, o comportamento humano permanece notavelmente previsível. Sempre haverá medo, ganância, impulsividade, exagero, otimismo, pânico e todos os demais padrões comportamentais que a humanidade repete há séculos. Ou seja, se prever o futuro é impossível, prever como as pessoas se comportarão diante dele é relativamente fácil.
Ainda assim, continuamos investindo enorme energia em tentar adivinhar o futuro, como se isso fosse nos proteger de novos riscos. Mas, segundo Housel, as maiores ameaças raramente são novas, mas versões atualizadas das mesmas de sempre, diretamente ligadas à atuação humana: excesso de confiança, subestimação dos riscos e complacência.
Prova disso são as crises financeiras ao longo dos séculos que, apesar de terem motivações, desdobramentos e ocorrerem em contextos históricos muito diferentes, compartilham causas psicológicas semelhantes. Um exemplo claro pode ser visto ao comparar a Crise de 1929, nos Estados Unidos, com a Bolha das Ponto.com, no ano 2000. Apesar da distância de mais de 70 anos, ambas nasceram das mesmas raízes emocionais.
A de 1929 foi impulsionada pela expansão desenfreada do crédito e pela compra de ações com forte alavancagem; a de 2000, pela euforia tecnológica que valorizava empresas sem lucro real. Em ambos os casos, investidores acreditaram que “desta vez era diferente” e que os preços continuariam subindo indefinidamente. A confiança excessiva, a subestimação dos riscos e a complacência coletiva criaram ambientes perfeitos para a formação de bolhas que, inevitavelmente, estouraram. Cenários diferentes, dinâmica emocional igual.
Como estar preparado?
Se não podemos controlar o futuro, podemos – e devemos – aprender a reagir melhor aos eventos que não previmos. Como diriam os estoicos, não controlamos o que acontece, mas podemos controlar como reagimos ao que acontece.
Na prática, isso significa adotar medidas que aumentem nossa margem de segurança: desenvolver planos flexíveis, ter expectativas realistas e dispersar riscos. Ou seja, a mesma fórmula implementada por José do Egito milhares de anos atrás: enquanto o plano avançava, mais celeiros eram construídos (flexibilidade), os 20% de alimentos armazenados não faziam falta na época de grande abundância (expectativa realista) e os riscos foram distribuídos ao longo do tempo (sete anos).
O fato é que o que dá certo sempre foi o que deu certo antes. Quem prospera não tenta adivinhar o futuro, mas se concentra em manter hábitos sólidos, uma poupança regular, fazer escolhas prudentes e manter a calma quando todos estão perdendo a cabeça.














