Rapper Xamã se expressa pela poesia e lança EP na quarentena
'Como Sobreviver ao Fim do Mundo Dançando' foi gravado em estúdio improvisado e traz mensagem sobre rap: 'Faz você se enxergar no outro'
Música|Gabriela Piva, do R7*

Xamã, natural do subúrbio do Rio de Janeiro, gravou o novo EP, Como Sobreviver ao Fim Do Mundo Dançando, em estúdio improvisado devido à pandemia da covid-19.
Por causa do isolamento social, Xamã teve de pausar outros projetos em que estava trabalhando.
"Acredito que ninguém estava preparado para isso. Não só a classe artística, mas todos os outros setores do mundo. O que eu acredito é que, pelo menos para os artistas, a gente ficou bastante tempo em casa, pensando nas nossas atitudes, na forma como a gente escrevia, sobre como a gente levava a nossa vida. Eu acredito que, quando tudo isso passar, a gente vai voltar bem melhor. Não só eu, como todos os outros [artistas]", declarou ao R7.
Com a inspiração na pandemia e o foco em si, Xamã contou que se expressa por meio da poesia e não é de hoje. Quando morava com a avó na zona Oeste do Rio de Janeiro, o artista usava o tempo em casa para ler gibis e contos, mas só foi introduzido à poesia com a professora Teresa, com quem teve aula no colégio.
"Ela me aplicou muitos livros de Chico Buarque, poesias de Chico Buarque, Henriqueta Lisboa, Olavo Bilac. A partir dessa professora, eu passei a escrever poesia com formato de poesia mesmo, com as estrofes e os versos. Quando eu tinha 12 anos, eu ganhei um concurso com a poesia chamada Apenas Hoje e essa professora foi bastante inspiradora para eu começar o trampo com poesias."
Para Xamã, o estilo trouxe uma forma de expressão: "É um mecanismo que eu consigo me expressar de forma bem clara e bem sincera. Às vezes, quando eu estou conversando, não consigo passar tudo o que estou sentindo, mas quando eu escrevo, declamo alguma poesia, as pessoas entendem exatamente o que quero dizer". Ele explicou ainda que isso o permitiu "se encontrar em outras pessoas" como uma forma de empatia.
Racismo e igualdade social
Era muito fácil se identificar e se enxergar no próximo onde Xamã morava. Contudo, as coisas seriam diferentes depois de um dia em 2017, quando decidiu correr na orla do sul de Rio de Janeiro e se viu algemado na ciclovia. Ele estava sendo acusado de roubo.
"Quando eu sofri isso, eu não sabia o que estava acontecendo até ficar algemado na ciclovia e entender que aquilo era o que tinha visto na televisão. Que quando eu fosse pra cidade grande, tinha que me preocupar com o preconceito, porque as pessoas poderiam pensar que sou um ladrão, dependendo da forma como falo, como estou vestido e pela cor da minha pele."
Foi quando o rapper percebeu que teria de se preocupar com coisas que, até então, não precisava se preocupar se estivesse onde morava.
"Nesse dia, eu passei a perceber muito mais que eu tenho que me preocupar muito, dependendo de onde estou e do que estou fazendo, porque posso levar um tiro na cara, estar sendo preso e acusado de algo que não fiz só porque tem alguém que acha que eu sou um bandido, mesmo não sendo."
O rap acabou se tornando uma forma de lutar por igualdade social conforme Xamã foi crescendo e percebendo outras questões que considera importantes.
"O que acontece é que eu acho que o rap traz muito isso, pelo fato de você se enxergar no próximo, você quer que ele vença também. Porque se o outro vencer, o mercado fica bom, grande e todo mundo ganha mais, recebe mais... E, a gente se trata melhor. Meio que é uma forma de você ajudar a sua própria família porque a sua família vai te ajudar também."
Xamã se envolveu em causas sociais e sempre tenta contribuir de alguma forma com ações beneficentes, assim como o lançamento do projeto musical Elas por Elas, ao lado de Agnes Nunes, como uma forma de homenagem às mulheres.
A volta por cima e 'Maria Maria'

Depois do episódio na orla do Rio de Janeiro, Xamã não conseguiu mais correr na rua por um tempo. No entanto, ele conquistou outros feitos, como fazer uma turnê nos Estados Unidos, ir para Amsterdã, Tailândia e grande parte do Brasil. Ao lado dele, estava a produtora, Maria Morais, para quem dedicou a faixa Maria Maria.
"Ela estava sempre comigo. O louco de trabalhar com alguém tão próximo é que, quando o trabalho acaba, a pessoa ainda está ali. Então, ela sabe exatamente como você se comporta, o que você sente, quanto tempo você passa trabalhando. Então, quando dá certo, as pessoas torcem muito mais. Ela é muito importante na minha vida."
Com mais de três milhões de ouvintes mensais, Xamã lançou Como Sobreviver Ao Fim do Mundo Dançando com 5 faixas, como De Novo, lançada no Dia dos Namorados, e Beatles e Apóstolos.
*Estagiária do R7, sob supervisão de Camila Juliotti