Em show do Capital em SP, Dinho ignora membros originais num dos maiores constrangimentos do rock brasileiro
Apresentação na capital paulista atraiu 8 mil fãs, que foram conferir o encerramento da turnê de 40 anos do grupo
Bandas de rock com integrantes rachados entre si não é novidade, mas o Capital Inicial leva isso a um nível totalmente diferente e constrangedor. A banda fez dois shows em São Paulo, neste sábado (29) e domingo (30), para marcar o encerramento de sua turnê comemorativa de 40 anos. E, apesar de divertido, tem um lado bem triste de ver o grupo em ação.
Já há relatos não-oficiais há alguns anos dando conta de que Dinho Ouro Preto e os irmãos Fê Lemos (bateria) e Flávio Lemos, todos integrantes originais do grupo, não se bicam. Eles praticamente não se falam, mas decidiram continuar tocando juntos, afinal o Capital é uma banda bem-sucedida e que gera dinheiro.
Este colunista nunca havia visto a banda ao vivo, então assistir ao encerramento da turnê parecia uma boa ideia.
O show é ok. Nada de muito sensacional, com um tanto de falta de personalidade típica do grupo e sem uma surpresa digna dos 40 anos de existência. Sem muito critério, o Capital vai tocando seus hits, tanto os clássicos lá dos anos 80 quanto os sucessos que surgiram no fim dos 90 e que foram até meados dos anos 2000.
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A falta de critério no repertório e a aleatoriedade não importam muito para o público. Os fãs do grupo lotaram a casa de show na apresentação de sábado e cantaram praticamente todas as músicas junto com Dinho.
A apresentação começou com Insônia, num pontapé inicial todo climático e uma bela iluminação. A partir daí, os hits foram se sucedendo com O Mundo, Eu Vou Estar, Todas as Noites, Leve Desespero, Música Urbana, Fogo, Independência e chegou ao fim da primeira parte com Primeiros Erros. Esta última é, possivelmente, o maior sucesso do Capital e é uma versão da canção composta por Kiko Zambianchi, lá nos anos 80. Foram 25 canções, incluindo aí as covers Que País É Esse?, Mulher de Fases e Por Enquanto.
Vendo o show, não tem muito como desviar o olhar de Dinho. Ele é o centro das atenções sem nenhuma dúvida e comanda a apresentação com seu carisma e energia. Não aparenta ter 60 anos.
Mas aí, você nota claramente que há algum problema ali sobre o palco. O Capital de hoje em dia, tem em shows, músicos de apoio. Fora o guitarrista Passarell, que é integrante fixo da banda, ainda estão lá um tecladista e um segundo guitarrista. Ao longo da apresentação, Dinho interage várias e várias vezes com todos estes. Mas, ei, ali em cima também estão o baixista Flávio Lemos e o baterista Fê Lemos.
Mas será que estão mesmo? Para Dinho, parece que não. O vocalista fica boa parte do tempo no centro do palco e se desloca várias vezes para sua esquerda, onde estão o tecladista e Ives. No lado direito, estão Fê e Flávio. Dinho parece nem dirigir o olhar para ambos. Não interage com nenhum deles durante toda a apresentação. Vai para o lado direito do palco e o baixista se desloca para o centro. Em alguns poucos momentos, Flávio fica próximo dos demais músicos do grupo, mas jamais de Dinho.
O cantor até menciona no microfone os nomes do baterista e do baixista. Mas faz isso do outro lado do palco e também não passa disso. Totalmente protocolar.
Chega a ser constrangedor o distanciamento entre os membros originais do Capital. Uma banda de rock não é isso, né?! Ou não deveria ser. Os três músicos que estão juntos desde o início dos anos 80 deviam estar lá, chorando abraçados e felizes pelos 40 anos de estrada. Mas não, fazem questão de deixar claro o racha que existe há tempos e que vai continuar lá.
Como dito acima, há muitas bandas no mundo com membros que não se bicam. Está aí o Guns N’Roses para provar. Axl simplesmente odiava Slash, mas depois de mais de uma década separados, o guitarrista voltou para grupo em 2016, onde está até hoje. Você pode chamar de fingimento ou o que for, mas no palco, Axl e Slash interagem, ficam próximos, há brincadeiras entre eles e por aí vai. Não há animosidade aparente.
Com o Capital, a história é outra. Fica nítida a relação deteriorada entre Dinho, Fê e Flávio. Tanto que os dois irmãos não fazem questão nenhuma de mostrar que estão ali por amor à causa. É nítido que querem apenas cumprir sua obrigação, fazer seu trabalho e ir embora para casa. Batem o ponto.
É muito chato isso acontecer numa banda de rock e, talvez, o público nem perceba. Mas para quem percebe, a coisa toda fica muito triste. É até desanimador ter uma banda brasileira atuando desta maneira.
Os fãs realmente não merecem gostar e torcer por uma banda que, no fim das contas, já nem é mais uma banda de fato. É só o grupo do Dinho.
Os textos aqui publicados não refletem necessariamente a opinião do Grupo Record.