Consignado CLT pode aumentar pedidos de demissão para trabalhador escapar dos descontos
Governo é alertado por setores de mão de obra sobre provável onda de desemprego e alta da inadimplência

Mesmo sabendo que boa parte dos brasileiros não tem nem sequer as noções básicas de educação financeira, o Governo Federal criou o Crédito do Trabalhador, que consiste em um empréstimo consignado para funcionários CLT. Aliás, talvez a medida tenha sido implementada justamente contando com isso.
Em um evento voltado ao mercado financeiro, o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, chegou a classificar o crédito consignado como benefício. “Por que o trabalhador do setor privado não pode ter o mesmo benefício do servidor público e dos aposentados?”, questionou.
O que o ministro não citou foi que, apesar de terem estabilidade de emprego e renda média 40% acima do setor privado, 70% dos funcionários públicos estão sufocados por dívidas. É à essa arapuca nada benéfica que os trabalhadores CLT passaram a ter acesso desde março deste ano, mas com um agravante: a promessa de juros baixos não se cumpriu.
Durante o anúncio da medida, o presidente Lula disse se tratar de uma oportunidade de crédito barato: “Agora eles (trabalhadores CLT) podem ter crédito barato para sair da mão do agiota. Não precisa mais pagar 10% de juros (ao mês). Você pode escolher entre bancos privados, bancos públicos. Aquele que cobrar menos, vá lá e faça. Será uma revolução nesse país”, afirmou.
Lula deu até algumas sugestões de uso do dinheiro: “É fazer o empréstimo para comprar alguma coisa que melhore a nossa capacidade de viver melhor, de melhorar nossa casa, a educação do filho, a qualidade de roupa que o nosso filho veste. É para isso que a gente pega o empréstimo, para tentar resolver um problema de doença, garantir que uma pessoa possa ter tratamento adequado”. É no mínimo curioso ouvir o presidente da República dizer que a solução para melhorar a educação e tentar resolver “problema de doença” seja um empréstimo.
Mas o que não se pode negar é que Haddad acertou em cheio ao dizer que o governo criou “uma modalidade que, apesar do aumento da Selic, permitirá que o trabalhador vá ao banco e se surpreenda com uma taxa de juro”. De fato, passados pouco mais de dois meses da medida em vigor, em vez de taxas baixas, o trabalhador tem se surpreendido com taxas que chegam aos 15% ao mês. Maior do que o percentual anual da taxa Selic. Maior do que o presidente disse que o agiota cobra.
Diante disso, empresários do setor de mão de obra, principalmente donos de supermercados, alertaram ministros do governo de que o consignado CLT a taxas tão altas pode causar uma crise no mercado de trabalho. Isso porque, ao verem boa parte do salário ser consumida pelo empréstimo, os funcionários podem pedir demissão para escapar dos descontos, o que também aumentaria a inadimplência. E mais: os trabalhadores recorreriam à informalidade, já que a retomada dos pagamentos só pode ser feita no próximo emprego com carteira assinada. Vale lembrar que a suspensão das cobranças gera juros extras, aumentando ainda mais a dívida.
Se essa era a saída para livrar o trabalhador das mãos de agiotas que cobram 10% ao mês na prática de uma atividade criminosa, segundo o artigo 4° da Lei nº 1.521/1951, o que o livrará dos tentáculos dos bancos que cobram, legalmente, ainda mais?
Este é mais um exemplo de que a falta de educação financeira aliada a medidas populistas podem afundar ainda mais o trabalhador enquanto prometem salvá-lo.