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Papo de Paciente

'Fui fazer exames para ser mãe. Saí com o laudo de uma doença grave'

A reviravolta na vida de Ana Carolina veio acompanhada de um transtorno depressivo. Um ano depois, ela mostra que é possível recomeçar

Papo de Paciente|Marcela Varasquim e Marcela Varasquim

Ana Carolina e a mãe, dona Ana
Ana Carolina e a mãe, dona Ana

Foi ao lado da mãe que Ana Carolina, na época com 31 anos, recebeu uma das piores notícias de sua vida até então: o nódulo que havia sentido na mama tinha grandes possibilidades de ser um câncer.

Na saída da consulta, enquanto as mãos trêmulas de Carolina tentavam equilibrar os inúmeros pedidos de exames para confirmar o diagnóstico, sua mãe foi conforto e amparo. Não havia dúvidas de que Carolina apenas se mantinha em pé porque dona Ana segurava suas pernas.

O motivo da ida ao ginecologista não era a desconfiança de um câncer. Casada com César havia três anos, Carolina queria realizar o sonho antigo de ter filhos e foi fazer exames de rotina para se preparar para uma gravidez.

Mas durante o ultrassom das mamas o profissional a orientou a procurar um médico especializado, porque havia um nódulo, segundo ele, "muito estranho". Foi assim que um caminho difícil e tortuoso roubou espaço de um momento mágico.


Transtorno misto ansioso depressivo

A biópsia demorou vinte dias para ficar pronta. Foi como abrir uma válvula para liberar o fluxo de pensamentos intrusos, potentes e ansiosos. Enquanto tentava não se afogar no mar agitado das incertezas, foi levada por cada um desses pensamentos, sem nunca ter pedido carona.


Quando se deu conta, Carolina não parava de buscar notícias sobre câncer e pensar sobre a doença, até se enrolar em um cobertor de angústia. Dessa armadilha, não era mais possível sair sozinha.

Quando teve a confirmação do diagnóstico de câncer, a ansiedade não foi embora, mas trouxe junto outros companheiros. Dentro da mente, havia um cabo de guerra entre a necessidade de agir rapidamente e a vontade de simplesmente não levantar mais.


Quando a segunda começou a ganhar de lavada, o mundo antes cheio de cores virou cinza, mesmo nos dias de sol. Carolina não conseguia mais pôr os pensamentos para dormir, e estar acordada também ficou ainda mais difícil.

Ela tinha feito a quinta quimioterapia quando sua mãe, que era seu braço direito e seu abraço confortável, sofreu uma intercorrência após uma cirurgia e, dias depois, entrou em estado vegetativo.

O médico disse que dificilmente dona Ana voltaria a se levantar sem sequelas, e Carolina passou a se dividir entre consultas, exames e um quarto de UTI. Eram duas — mãe e filha — tentando encontrar de novo a superfície depois de uma onda forte.

Altos e baixos se intercalavam no eletrocardiograma da vida. Até que um dia dona Ana deixou o hospital, para ocupar um espaço mais honrado e eterno: no coração de Carolina.

Recomeço

É setembro de 2023. Um ano e alguns meses depois do início do tratamento, Carolina começa a enxergar a porta de saída do transtorno misto ansioso depressivo, que não abre de uma vez, nem rápido.

Já o câncer é uma página que precisa ser revisitada sempre: ela faz exames com frequência e toma um medicamento para se manter em remissão, até um dia receber a cura. Na última consulta, perguntou ao médico quando finalmente poderá ser mãe — nem o pior dos terremotos destruiu seu sonho. O doutor pediu para ter essa conversa daqui a três anos, quando, pelo andar da carruagem, poderá interromper o remédio sem grandes riscos para engravidar.

No carro, Carolina coloca Emoções, de Roberto Carlos, para tocar. No colo, leva algumas flores. Não que ela precise ir até lá para se encontrar com dona Ana, mas nesse dia em especial sente saudade do que as mãos não podem mais tocar. Quando chega ao local, troca algumas palavras com a mãe, que responde pelo coração, e entrega as flores ao vento.

O luto é nunca esquecer, mas seguir o caminho apesar da falta. Carolina, aos poucos, pavimenta a estrada aberta por um trator. Ela aprendeu que, depois da noite, o amanhecer é um abraço que leva quem dormiu a encontrar uma nova chance. Quem sabe daqui a três anos alguém ouça uma historinha sobre quem foi a vovó.

Os textos aqui publicados não refletem necessariamente a opinião do Grupo Record.

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