Impostos no Brasil: o olho que tudo vê (e tudo tributa!)
Veja como a tributação brasileira funciona e perceba que o Fisco está mais perto do que a roupa que você veste (e nela também!)
Melhor Não Ler|Do R7
Zé da Roça é um brasileiro simples do interior que só queria um lugar de mato verde pra plantar e pra colher. E que, do fruto de seu trabalho, pudesse ter uma casinha branca de varanda com quintal e uma janela para ver o sol nascer.
Ele realmente vê o sol nascer todo santo dia, mas não calmamente de sua janela, e, sim, do meio da roça, onde pega no batente antes de a manhã clarear. O que mais intriga Zé da Roça é como o dinheiro, pelo qual ele dá esse duro danado, passa por suas mãos calejadas como se fosse um punhado de areia. Quando ele dá por si, só ficaram uns grãozinhos que não dão nem para levar a patroa na cidade e comprar um vestido novo.
Um dia, porém, Zé da Roça comprou meio quilo de pés de galinha porque na televisão disseram que é muito melhor do que picanha. A iguaria veio enrolada num jornal que falava sobre tributos. Ele deu graças a Deus por não pagar nada daquilo, mas uma coisa chamou sua atenção: uma lista imensa que mostrava a porcentagem de impostos embutidos nos mais diversos produtos. “Eita, diacho!”, disse ele, arregalando os olhos.
Zé da Roça sentou-se em sua cadeira de plástico (que teve 40,62% de imposto embutido no preço) e tirou seu chapéu de palha (sobre o qual incide 33,95% de imposto). Ele até afrouxou seu cinto de couro com fivela, que paga dois impostos diferentes: 40,62% sobre o cinto em si e 36,54% sobre a fivela. “Que doidêra!”, exclamou ele, tirando um lenço do bolso para secar a testa, sem saber que 35,75% do preço foram só para pagar impostos.
Em sua plantação de feijão (cujo imposto é 17,24%), Zé usa um bom adubo (imposto de 25,29%), mas não usa luvas para fazer o plantio porque são muito caras (40,85% são só de impostos). Imerso naquele mar de números, ele confere o relógio (56,14%) e vê que é hora de seu cafezinho (16,52%) com açúcar (30,60%) que a patroa deixou prontinho na garrafa térmica (44,63%).
Depois de trabalhar até o comecinho da noite, Zé toma um banho quente em seu chuveiro elétrico (48,23% de imposto), com seu sabonete preferido de alfazema (31,13%) e o xampu cheiroso da patroa (44,20%). Ele se seca com uma toalha surrada (34,67%), mas bem limpinha, lavada com sabão em pó (40,80%) e amaciante (34,30%). Os dois jantam os pés de galinha (26,80% de imposto) com arroz (17,24%) e lentilhas (26,20%).
A patroa não sabe por que Zé parece meio zonzo, mas o manda se deitar mais cedo. “Cê não pode ficar doente, homem. Tem água e luz pra pagar!” Ela também não sabe que essas contas têm 24,02% e 48,28% de impostos respectivamente (senão, ficaria zonza também!).
Chegando no quartinho modesto, lá estão seu cobertor, lençóis e travesseiros (26,05% de imposto cada) e seu colchão (28,36%) velhinho, que já deu o que tinha que dar, mas vai ter que fazer hora extra porque tá tudo muito caro!
Faz muito tempo que ele não dorme de pijama (34,67% de imposto) porque qualquer camiseta velha (que também tem 34,67% de imposto) faz muito bem esse papel. Mas do chinelo (31,09%) ele não abre mão, porque seus pés precisam de um alívio daquela botina pesada (36,17%).
Naquela noite, Zé da Roça não consegue sonhar com sua casinha branca porque viu que a tinta tem 36,17% de imposto. Na verdade, ele nem consegue dormir tentando entender o que o governo faz com tanto dinheiro, já que ali, na sua cidade, não tem posto de saúde, nem farmácia popular, nem mesmo linha de ônibus, além do que, a única escola da região está caindo aos pedaços.
Ele lembra que está chegando a época em que aqueles homens engravatados aparecem para pedir voto em troca de dentadura e saco de cimento. Todo mundo sabe que depois disso eles vão desaparecer no mundo, mas já que eles estão dando, seria desfeita não aceitar, né?
Mas a pergunta que não sai da cabeça de Zé da Roça é: “Cumé que esse tar de governo que nem lembra que nóis existe, teve essa ideia de arrancá o dinheiro das nossas mão sem a gente percebê, sô?”
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