O politicamente correto e ‘a moça que trabalha lá em casa’
Aprenda em uma única lição como ser tolerante e empático sem ter de ser tolerante e empático
Melhor Não Ler|Do R7
Se você ainda não é um ser de luz, mas quer se adequar ao mundo do amor (onde só se odeia quem pensa diferente), da tolerância (onde não há perdão para quem usa “palavras ofensivas”) e da empatia (aplicada apenas a alguns, mas nunca a todos), saiba que há regras a seguir, afinal, a liberdade de hoje em dia vem cheia de proibições.
Como são muitas as imposições do politicamente correto – e a cada dia surge uma nova –, estamos aqui para ajudar todos aqueles que querem alcançar o alto nível de submissão necessário e aprenderem a sinalizar virtudes mesmo sem ter nenhuma. Hoje, você aprenderá como adquirir o direito de falar uma coisa, mas fazer outra. Para isso, vamos usar o exemplo clássico da “moça que trabalha lá em casa”. Anote aí!
Jamais chame uma empregada doméstica de empregada doméstica. A pessoa que foi empregada para trabalhar em domicílio e cujo cargo oficial é empregada doméstica, jamais deve ser chamada de empregada doméstica, pois isso vai ofendê-la imensamente e para todo o sempre.
Não importa que você acha aquele trabalho degradante e praticado por “pessoas inferiores e sem qualificação”, desde que diga sempre que “todo emprego é digno” e que você “respeita muito”, embora pague o mínimo possível, finja que não sabe que ela trabalha mais de oito horas por dia e sempre invente uma mentira para atrasar o pagamento. Também não importa que depois da aprovação da PEC das Domésticas (exigindo pagamento de direitos trabalhistas), você a obrigue a fazer todo o serviço da semana inteira em apenas dois dias. O que importa é que, como todo bom hipócrita, você exija que os outros façam o que é certo, enquanto você sabe que nunca fará.
Os termos politicamente corretos para se referir àquela ingrata que não reconhece tudo o que você fez e faz por ela, são: “a moça que trabalha lá em casa”, “secretária do lar” ou “a mulher que ‘ajuda’ na limpeza” (embora ela faça tudo sozinha). Para reforçar a ideia de que você é uma pessoa incrível, diga também que “ela é quase da família”, que você até “permite que ela se sente à mesa” e que não se importa com “a cor da pele dela”.
Bagunce a casa inteira e suje muito mais louça do que o necessário. E, claro, ensine seus filhos a fazerem o mesmo, pois você “não paga a mulher à toa”. E jamais perca a oportunidade de dizer que você nem precisa dela, mas como tem peninha por ela ser “humilde” (jamais pobre) e morar numa “comunidade” (favela não), você acabou “ficando com ela assim mesmo”.
No mais, tenha liberdade para fazer “a mulher” de gato e sapato, pois ela precisa saber qual é o “lugar dela”, mas como uma boa marionete, lembre-se de que a sua liberdade acaba onde as proibições do politicamente correto começam.
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