Beth Carvalho foi trilha sonora da vida de qualquer sambista   

A memória afetiva aflora a cada acorde. Pode colocar para tocar qualquer um dos sucessos que Beth Carvalho emplacou ao longo da carreira para o coração disparar e a letra vir, sem esforço, como se a gente ainda cantasse todo dia.

"Vi tanta areia, andei, na lua cheia eu sei, uma saudade imensa...". Andança foi, de longe, a música mais cantada em toda rodinha em que havia alguém com um violão, lá pelo fim dos anos 70, início dos 80. Beth Carvalho fez da música de Edmundo Souto, Danilo Caymmi e Paulinho Tapajós um hino, desses que grudam na cabeça, mas com direito a uma poesia imbatível. 

A notícia da morte da cantora e compositora nos faz relembrar a dimensão de sua presença na vida de qualquer um que ame samba, como eu. Da deliciosa ode à vingança que é Vou Festejar ao ritmo contagiante de Coisinha do Pai, as músicas de Beth não esperavam o Carnaval para estourar. Viviam nas chamadas paradas de sucesso, e ganhavam o Brasil inteiro.

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Não bastasse brilhar sua estrela, Beth também jogou para a luz seus afilhados, entre eles Zeca Pacodinho, Fundo de Quintal, Almir Guineto. Todos embalaram inúmeras rodas de samba que frequentei ao longo da vida, das improvisadas feitas depois do treino no Clube Espéria, até as profissionais, em botecos e casas de shows. 

Beth Carvalho era a voz das manhãs de domingo lá em casa, quando doutor Moacyr, meu pai, pegava o pandeiro e ficava acompanhando a melodia, enquanto eu aprendia a sambar de frente para o espelho da sala, um tanto desengonçada com a sandália de salto plataforma da minha mãe. 

Levei aquela voz comigo pra vida. Uma suavidade potente, se é que isso é possível. Hoje, a única coisa que sou capaz de fazer é agradecer. Agradecer por tudo o que Beth Carvalho fez pelo samba, pelos clássicos que criou, pela música popular brasileira e por nossos domingos. A vida foi mais alegre graças a ela. Vá em paz, rainha!