'É o Amor' faz 30 anos como maior hino de Zezé Di Camargo e Luciano
Música, que ultrapassou os limites do sertanejo e soma mais de 70 regravações, nasceu do desejo em afirmar o sentimento universal
Música|Ricardo Pedro Cruz, do R7
“Eu não vou negar que sou louco por você. Estou maluco pra te ver, eu não vou negar. Eu não vou negar, sem você tudo é saudade. Você traz felicidade, eu não vou negar.” Zezé Di Camargo sabia bem o que queria com É O Amor, canção que nasceu em 1991 e abriu as portas do sucesso para a dupla formada pelo cantor e o irmão, Luciano Camargo. O sertanejo estava decidido a dar uma resposta a ‘Negue’, música eternizada na voz de Maria Bethânia, e transformar um dos sentimentos mais universais do mundo em um grito afirmativo.
“Ele chegou em casa respondendo a música, dizendo: ‘Eu vou afirmar o amor. Eu não vou negar’. Eu não costumava ficar para ver o Zezé compor, mas nesse dia eu fiquei para ver. Ela foi a 13ª a entrar no repertório do disco. Eu lembro que ele fez a primeira parte muito rápido e empacou. Acabou terminando a música depois e me mostrou. A história da música é tão rica quanto a história dos artistas”, contou Luciano, em conversa com a reportagem do Portal R7.
Aquelas estrofes escritas pelo homem simples da roça começaram a ganhar o mundo tempo depois pelas ondas de transmissão da Rádio Terra de Goiânia, em Goiás, graças ao esforço do primeiro “profissional responsável pelo marketing” da dupla: Seu Francisco. O pai de Zezé e Luciano deixou uma fita cassete na estação de rádio e, a partir daquele momento, passou a ligar incansavelmente para pedir a música dos filhos. À época, se você tivesse cruzado com ele, certamente teria sido abordado com uma ficha de orelhão na mão para que também fizesse o mesmo.
“Eu falo que o meu pai, mesmo sem ter estudado, fez marketing. Ele buscava pessoas na obra para fazer ligações para a rádio. A importância do meu pai para a nossa carreira começou no momento em que ele se casou com a minha mãe. O sonho do meu pai sempre foi a família, os filhos. A dupla nasceu quando o meu pai colocou a mão na barriga da minha mãe”, relembra o músico.
O maior sonho do meu pai era ter os filhos cantores
Dizer ‘’sim” talvez tenha sido o maior segredo do “conto de fadas” que os sertanejos e a família passaram a viver quando o reconhecimento nacional trouxe a “paz” que tanto precisavam para “sobreviver”. As 35 frases que compõem a música, que nesta segunda-feira (19) completa 30 anos, ganharam vida e sentidos próprios para pessoas de todos os cantos do mundo. Seja nas brincadeiras com quem dá sinais tímidos de que está apaixonado ou nas declarações nada contidas, ela se tornou um pouco de cada um que já experimentou o amor.
Ao todo, a canção acumula mais de 70 regravações e mais de 1 bilhão de execuções — de acordo com dados divulgadas pelo Ecad (Escritório Central de Arrecadação e Distribuição). “Sempre que alguém me pergunta do começo eu falo que foi muito rápido. Eu pensei em gravar e já tinha virado sucesso. Eu já estava na estrada fazendo sucesso. No primeiro ano, já tivemos música em trilha sonora de novela. É um privilégio fazer sucesso num país como o nosso”, conta Luciano.
'Maior sonho do meu pai era ter os filhos cantores'
Seu Francisco, morto em novembro do ano passado, após anos lutando contra problemas de saúde, sonhou com a dupla antes mesmo do nascimento dos filhos. Para Luciano, a parceria musical com o irmão começou quando o pai se casou com a mãe, Dona Helena. Mesmo “sem instrução”, o lavrador foi, sem dúvida alguma, o maior entusiasta dos sertanejos.
“Meu pai não tinha outro sonho. Ele era um lavrador. No filme, por exemplo, nós tivemos que tirar coisas do roteiro. Se colocasse tudo, iria virar um dramalhão a vida dele. Ele chegava a fazer uma lavoura para comprar instrumentos. O maior sonho do meu pai era ter os filhos cantores.”
O pai da família Camargo morreu aos 83 anos após anos lutando contra um enfisema pulmonar. Luciano, no entanto, não conseguiu ir ao velório dele porque, à época, havia sido diagnosticado com covid-19.
“Uma semana antes eu passei o dia com ele. Mesmo adoentado, quando dava uma melhorada, ele contava alguma piada. Ele estava consciente. Eu vim para São Paulo e voltaria para lá [Goiânia] depois de três dias, mas peguei covid-19 e não pude voltar. Não consegui me despedir.”
‘Não estamos na internet como a maioria’
Com o surgimento do chamado “sertanejo universitário” no mercado da música, que nos últimos anos passou a exigir cada vez mais novidades e hits em curto espaço de tempo, a busca por composições estabeleceu um mercado altamente rentável no segmento. Diferentemente do passado, quando uma música poderia ser trabalhada por seis meses ou até mesmo um ano, na realidade atual um hit acaba tendo uma vida útil de no máximo três meses. Isso quando dá certo.
Entretanto, mesmo com as transformações da indústria, Zezé Di Camargo e Luciano podem ostentar uma posição confortável no cenário musical. A dupla, que em números atuais não compete com nomes como Gusttavo Lima, por exemplo, se orgulha do espaço consolidado que ocupa.
“Quando você está consolidado com o seu estilo, se chegar outro ou até mesmo se criar braços, você não precisa. Você continua o mesmo. Em 2010, por exemplo, Mentes Tão Bem foi a música mais tocada. Tempos depois, Flores em Vida. Outra música romântica. Nós só disparamos a nossa música agora e nem divulgamos. No entanto, ela está entre as dez. É um espaço consolidado. Muito tempo que não somos a música mais tocada. Aquela coisa maçante, que toca toda hora. Toca bastante. Não estamos na internet como a maioria. Mas, antes da pandemia, fazíamos 130 shows por mês.”