Análise: “Vídeos sugeridos”, a hipnose em alta
Que muitas pessoas perdem horas e horas nas redes sociais não é segredo para ninguém, mas a nova ordem é direcionar o que elas vão assistir
Patricia Lages|Do R7

Por definição da Associação Americana de Psicologia, hipnose é um estado de consciência que envolve atenção focada em algo, com a redução da percepção periférica, causando uma resposta maior à sugestão.
E não é isso que acontece com quem passa horas e horas com os olhos colados em uma tela, com atenção focada nas postagens, sem ter a menor ideia do que acontece ao redor e, ainda por cima, querendo ser, fazer e ter o que as redes sociais sugerem?
Esse comportamento não deixa de ser uma espécie de hipnose que faz com que as pessoas fiquem mais suscetíveis às sugestões que lhe são apresentadas. Sem perceber, elas passam a se comportar como seus influenciadores, a se vestirem como eles se vestem, a falarem como falam, a fazer o que fazem e chegam até a se endividar para ter o que eles têm.
Na semana passada, o Instagram lançou um novo layout que dá mais visibilidade às funções “reels” e “shop”. A primeira traz sugestões de vídeos, onde a própria plataforma escolhe, de forma contínua, o que o usuário vai assistir. A segunda dispensa explicações.
A função reels funciona mesmo como um carretel – um dos significados da palavra – pois prende a atenção do usuário emendando um vídeo atrás do outro, formando uma longa corda que vai se emaranhando cada vez mais. Enquanto isso, a pessoa se desliga da realidade e as horas passam como num piscar de olhos.
E em meio a essa hipnose, lá está a função shop, no ícone do lado direito do reels – já que a maioria da população é destra – para facilitar as compras de quem está desligado do mundo real e totalmente envolvido em uma atmosfera emocional artificial que busca por mais e mais dopamina.
As redes sociais podem representar apenas uma distração para muita gente, mas para alguns, são um negócio altamente lucrativo. Mas não só isso, pois elas têm se mostrado uma ferramenta muito útil na doutrinação e disseminação de ideologias, chegando inclusive a censurar postagens que julgam ser “fake news”, “desinformação” ou “conteúdo impróprio”, mesmo não sendo. A mesma postagem pode ser liberada em um perfil e censurada em outro, mostrando que o que importa não é a postagem, mas sim, quem a posta.
Cada vez mais o usuário será conduzido a ver o que as redes querem que ele veja, a ler o que querem que ele leia, a comprar o que querem que ele compre e, pior, a pensar como querem que ele pense. Mas, claro, tudo isso sem deixar de passar a falsa impressão de que o controle está nas mãos de quem usa, não de quem entrega.
As redes sociais são, sem dúvida, uma excelente ferramenta de conexão e negócios. Além disso, são um caminho sem volta, pois facilitam a vida das pessoas em uma série de aspectos. Porém, como tudo na vida, existem ônus e bônus e cabe a cada um estabelecer o limite entre o que é bom e o que não é. Todos temos condições de fazer essa avaliação, desde que não estejamos sob os efeitos dessa nova hipnose.
Autora
Patricia Lages é autora de 5 best-sellers sobre finanças pessoais e empreendedorismo e do blog Bolsa Blindada. É palestrante internacional e comentarista do JR Dinheiro, no Jornal da Record.