Casa sem cara de capa de revista, kitnets famosas e internet: Patricia, da DOMA Arquitetura, fala sobre tudo
Pequena, simples e acolhedora: qual será decoração do momento para as casas brasileiras, segundo DOMA Arquitetura
Na época das revistas, eu ainda não tinha idade para consumir os tabloides que faziam sucesso entre os adultos, como os de fofoca ou negócios. Acumulei no máximo algumas edições de revistas teen da época, como a Recreio e a Genius, ou qualquer outra que viesse com um pôster do RBD. Mas nada disso chegava perto da devoção das leitoras fiéis às revistas de decoração.
Um amigo me contou que sua mãe colecionava vários exemplares das revistas de decoração. Perguntei se ela se inspirava nas fotos das revistas para decorar sua casa, mas pela resposta dele percebi que a realidade das mansões cariocas publicadas na revista era muito distante da casa que eles moravam em Amparo, no interior de São Paulo. As matérias e fotos eram, sim, lindas, mas faltavam conexão e um pouco de pé no chão com a realidade da maioria das famílias brasileiras. Faltava identificação. Pra mim, ver casa igual a minha, de “gente real”, é que me inspira a transformar meu lar.
Nesse papo que você vai ler agora, descobri que hoje em dia, para deixar a casa com cara de capa de revista, é só deixar a sua casa com cara de lar!
Estreando o Vivendo em Studio, coluna do R7 que vai mostrar a vida nos pequenos espaços. Casas reais, dicas de verdade. Vivo há 3 anos num apartamento de 26m².
Jornalista e inscrito… arquiteta e youtuber… os papeis se cruzaram a todo momento na conversa com Patricia Pomerantzeff, ou DOMA, como é carinhosamente conhecida pelos seguidores do seu canal no Youtube ‘DOMA Arquitetura’, hoje o maior canal do nicho aqui no Brasil.
Abrir essa coluna a entrevistando é algo simbólico para mim. Foi assistindo a um de seus vídeos, onde ela transformava um apartamento de 30m², que decidi comprar minha mini casa de 26m².
Aquele conteúdo me mostrou que era possível viver bem em um espaço pequeno. Essa inspiração não só influenciou a minha escolha de moradia, mas também me motivou a criar meu canal no YouTube e, agora, esta coluna aqui no R7.
Patrícia não foi apenas uma das primeiras arquitetas a criar conteúdo sobre decoração, mas ajudou também indiretamente muitas pessoas que tiveram, com seus vídeos, o primeiro contato com a arquitetura.
Os vídeos que mostram as reformas de seus clientes têm inspirado pessoas comuns que acabam aplicando, em suas casas, as soluções mostradas por Patrícia. É engraçado que mesmo que alguns dos projetos de Patrícia lembrem aqueles lindos projetos das revistas de decoração, dá vontade de mudar tudo em casa assistindo aos seus vídeos. Parece acessível e próximo da gente.
Abaixo uma imagem da minha casa, cheia de tons de madeira inspiradas no famoso Freijó, que rendeu a Patricia o apelido de Pat Freijó.
“A gente não mostra pensando que um dia pode ser tendência’’
Vivendo em Studio, R7: Acho que tem muita gente que não fez projeto com você, mas tem um projeto quase by DOMA Arquitetura em casa.
Patrícia: “É muito bom ouvir isso, porque a gente acaba mostrando ali o dia a dia dos nossos projetos, das nossas obras, não pensando em criar uma tendência. Mas, no final das contas, as pessoas percebem que é uma solução prática, possível, acessível e que daria certo na casa delas também, porque tá funcionando ali no vídeo que eu tô mostrando. Então, é aquele incentivo para pessoa tomar coragem e transformar um pedacinho da sua casa.
Então, fico feliz de saber que é uma tendência, né? A gente não mostra pensando que um dia pode ser tendência, mas acho que boas ideias num subconsciente coletivo acabam se tornando uma tendência interessante.”
Embora Patrícia tenha assinado projetos para figuras famosas na internet, como uma casa para a cantora Pabllo Vittar, o comentado apartamento de Dora Figueiredo, e o estúdio de Casemiro Miguel (da Cazé TV), são os projetos de pessoas comuns que mais conquistaram o público no seu canal.
A conexão entre os projetos de Patrícia com a realidade de quem assiste é fundamental para o sucesso do canal. Seus vídeos não apenas apresentam soluções criativas, mas também mostram possibilidades replicáveis em casas, na maioria das vezes, “reais” (reais que eu digo aqui, casas como a nossa).
“Menos capa de revista e mais acolhimento”
Vivendo em Studio, R7: Você já trouxe muitas tendências que a gente acompanhou [e copiou], e você já disse que não foi sua intenção trazer como tendência, mas sim como algo que funciona para a vida das pessoas. Tem algo que você já está de olho pro ano que vem? Algo que você acha que vai estourar?
Patrícia: “O ar de acolhimento é muito mais forte… aquela casa com cara de casa. Materiais naturais ou que remetem a materiais artesanais, por exemplo. Revestimentos que muitas vezes são feitos pela indústria, mas que parecem que foram feitos à mão. Tudo isso traz acolhimento.
Aquela história do luxo silencioso, uma luz mais indireta, né? A gente tem sempre essa luz amarelinha, aconchegante. No final das contas [a casa] é o refúgio: menos capa de revista e mais acolhimento.”
Patrícia, que parece fugir de consensos e renunciar a tendências do nicho, defende que na arquitetura e na decoração não existe uma verdade única ou definitiva. Não há regras padrão, mas soluções que se alinham a cada necessidade. O que importa aqui é o significado que cada espaço tem para quem vive ali. Faz sentido pra você? Então, é isso!
Quando decoramos sozinhos, é fácil cair no risco de seguir modinhas passageiras. E logo percebemos que nossas casas acabam parecendo todas iguais. Durante a conversa com ela, percebi que o método usado com seus clientes no seu escritório pode servir de inspiração para você que decide decorar sozinho:
As referências devem estar dentro de casa, e não apenas numa pastinha do Pinterest.
Mas, se for pra reproduzir algum padrão, algo que funcione em toda casa e nunca sai de moda, Patrícia tem suas dicas - principalmente para nós que moramos em casa pequena:
Vivendo em Studio, R7: Você já fez projetos muito diferentes, desde microapartamentos até coberturas duplex, e sempre tem dicas que podem ser aplicadas no dia a dia. Como os leitores que vivem em pequenos apartamentos podem adaptar suas dicas?
Usar o mesmo piso na casa toda
Patrícia: “Sabe que tem algumas soluções que fazem sentido em muitos projetos. Por exemplo, apartamentos pequenos, a gente sempre tende a ter uma amplitude do olhar, uma continuidade do olhar para ter a sensação de amplitude. Então usar o mesmo piso no apartamento inteiro, né? Cozinha, sala, quarto, banheiro...
Quando é tudo integrado, você não tem aquela quebra de olhar. Então isso traz aquela sensação de um espaço mais amplo. Fica muito bom, né? Quando a gente percebe que o apartamento dá uma crescida.”
Ambientes bem iluminados e com luz indireta
“Trabalhar uma boa iluminação. Ambientes escuros tendem a trazer um ar de claustrofobia. Quando a gente trabalha bem a iluminação, tudo aquilo fica iluminado. A gente fala: nossa, tá amplo por aqui. E a iluminação indireta, ao mesmo tempo, traz o acolhimento que eu gosto bastante. Também tende a funcionar bem geralmente.”
Móveis planejados e bem pensados
“Ah! Uma marcenaria bem pensada. Acho que seria minha terceira dica. Trabalhar bem o mobiliário solto é super interessante, mas para apartamentos pequenos acaba sobrando espaços ali ao redor que poderiam ser melhor aproveitados.
Num apartamento pequeno, a gente tem que pensar milímetro a milímetro, o melhor aproveitamento possível. Então aquela marcenaria bem desenhada, bem planejada, que tem mil soluções num único móvel é um bom caminho.”
Tem quem não goste das dicas da Patrícia, mas isso só reforça a sua teoria de que na arquitetura não existe certo ou errado mesmo, ainda mais para projetos tão personalizados como os que ela mostra no canal:
“Se eu apresentasse um projeto para um milhão de pessoas, talvez três ou quatro gostariam exatamente daquele jeito”
Patricia: “Adoro os comentários, geralmente são únicos porque eu pergunto no final de cada vídeo como você faria se fosse o seu apartamento ou qual foi o seu cantinho preferido de cada projeto.
E a maioria dos comentários são sempre elogiando. As pessoas são muito queridas comigo na internet, eu realmente sinto esse carinho. Então, as pessoas elogiam ali o detalhe do projeto, mas… sempre tem um mas…”
Vivendo em Studio, R7: A internet, né?
Patrícia: “Não. É porque eu pergunto! Aí a pessoa conta o que faria diferente para aquele projeto se fosse a casa dela. E é uma delícia ler, porque fico imaginando como é a vida daquela pessoa. Então, nossa, ela não usaria aquele banheiro, ela preferia uma despensa, nossa, ela colocaria o sofá em outro lugar, nossa, ela tem sete gatos e assim por diante.
Então, realmente se eu apresentasse um projeto para um milhão de pessoas, talvez três ou quatro gostariam exatamente daquele jeito, sem mudar uma vírgula. Mas a grande maioria ajustaria algum detalhe. De novo, arquitetura é ‘humanas’. Então, cada pessoa tem ali aquela lista de desejos e necessidades únicas, para cada um. Isso é o mais legal no final do dia, né?”
“Niemeyer que me perdoe!”
Um dos projetos mais comentados recentemente foi a reforma de um apartamento no Edifício Copan, de Oscar Niemeyer. Era o sonho do escritório DOMA Arquitetura assumir algum projeto no número 200 da Avenida Ipiranga.
A proposta deles, feita a mão para uma proprietária misteriosa - que Patrícia diz não poder revelar de quem se trata -, tinha os desafios clássicos das plantas dos anos 50, como a falta de ventilação natural e de iluminação nos banheiros. No entanto, o destaque dado pela internet para o resultado da reforma não foi para os problemas superados naquela difícil planta, mas sim para um microondas:
Patrícia: “Nossa cliente pediu ali um microondas embaixo na cozinha. Eu lembro que foi o tal do meme. E a gente, como profissional da área, deve falar, como arquiteta, que esse microondas aqui não vai funcionar ergonomicamente. Você não vai se sentir bem pegando qualquer coisa ali embaixo”. Não, Pat, - ela dizia. Eu não uso microondas, eu não cozinho no dia a dia. Tem restaurantes maravilhosos aqui embaixo do Copan, eu vou descer, eu vou comer ali e eu prefiro os meus copos aqui no alto. Bom, tem profissionais que batem o pé e exigem colocar da sua maneira ou falam, olha, tchau, não quero mais fazer o seu projeto. Eu preferi falar, olha, se você tiver certeza disso, vamos seguir. E foi o que a gente fez. Depois de um tempo ela se mudou, ela saiu do Brasil e aí ela falou por telefone, Pat, nosso apartamento vai para locação, e me entregou a chave. Se você quiser fazer alguma coisa, o apartamento é seu. Vai lá! No dia seguinte eu mudei o microondas de lugar.”
A internet está em paz agora que o microondas foi para cima do móvel. Em breve divulgo aqui na coluna a imagem que vai garantir a paz global de 2025.
O principal público do canal DOMA Arquitetura está, segundo Patrícia, nos grandes centros urbanos. Uma galera que está cada vez mais espremida e sem espaço com os novos prédios que não param de crescer. Morar em apartamentos pequenos é uma realidade muitas vezes não compreendida por quem está fora das capitais e no interior, geralmente com bastante espaço. Essa já é uma realidade nossa por aqui. O canal ajuda muito a pensar (e repensar) os studios:
Vivendo em Studio, R7: Há algo em comum nos seus vídeos mais vistos: a metragem dos apartamentos. Por que você acha que as pessoas se encantam tanto em ver soluções para apartamentos pequenos?
Patricia: “[...] Eu tenho certeza que no final das contas os meus vídeos atingem as pessoas que estão querendo melhorar realmente o dia a dia. Nossa, eu tô vivendo nesse apartamento pequeno e tô incomodada porque tem uma bagunça aqui ou eu não tô me sentindo bem. Então, o que eu posso fazer para melhorar esse meu cotidiano? A arquitetura muda a qualidade de vida das pessoas.”
A arquitetura tem mudado a qualidade de vida e o bolso das pessoas
Depois de comprar o meu apartamento pequeno, eu precisava de ajuda para fazer caber tudo da minha rotina em 26m². Fui o primeiro da minha família a contratar um arquiteto para organizar minha casa.
A arquitetura parece estar mais acessível para o brasileiro, não só pelos centenas de arquitetos que hoje criam conteúdo gratuito na internet, mas também como direito garantido pela Lei de ATHIS, direito federal garantido desde 2008 para famílias com renda de até três salários mínimos, dando apoio para projetos, acompanhamento e execução de obras destinadas à construção, reforma, ampliação ou regularização fundiária de moradias.
Patricia: “Eu fico pensando assim, mas a pessoa tá com problema no dente, ela arranca sozinho em casa olhando no espelho? Ela vai no dentista! A pessoa vai fazer uma reforma, tem que ter um profissional do lado, porque senão acaba gastando mais dinheiro, acaba se estressando, levando muito mais tempo. Então, acaba sendo um custo-benefício você ter um projeto. E hoje em dia é muito bom saber que isso tá mais divulgado, né? Que as pessoas entendem que realmente ter um arquiteto ali do lado, desde o começo do projeto criativo, faz total diferença.”
Todo mundo tem uma ideia da sua casa, e do que acha melhor para ela. O mais legal de contratar um arquiteto é que eles acabam trazendo outras visões para aquilo que já estava viciado na nossa mente. “O que eu mais gosto de ouvir no final de uma reunião com os nossos clientes era: Pat, não tem nada a ver com o que eu te pedi, mas ficou a minha cara”, comenta Patrícia.
Relembro outro projeto que viralizou nas redes sociais, feito no Edifício Viadutos, prédio icônico de Artacho Jurado.
Patricia: “Foram dois vídeos desse mesmo apartamento. A gente criou o quarto do casal com uma cama suspensa, então tinha o closet ali embaixo. Por conta do pé direito alto, a gente tinha mais de três metros de altura, então possibilitou a gente ser mais ousado. A ousadia que é vista nesse projeto [...] não vem só da maturidade da profissão, mas é muito bom a gente sempre tentar uma solução diferente com o aval do cliente, claro.”
O conteúdo desse nicho, que Patrícia foi uma das pioneiras com seu canal, não apenas impulsionou seu negócio, mas também inspirou pessoas comuns a transformarem suas casas. Agora, Patrícia busca compartilhar esse legado de transformação com outros empreendedores por meio da Academia DOMA. Nesse programa, ela oferece um mergulho profundo no cotidiano do seu escritório, revelando como sua equipe atende, prospecta e colabora com os clientes para alcançar bons resultados.
Estreando a coluna, pedi umas dicas para essa nova empreitada. Quero realmente ser útil na vida do leitor do R7 e dos inscritos do nosso canal no Youtube:
“O bonito fica muito vago”
Patricia: “conversar com marceneiro, conversar com vidraceiro, e serralheiro, com pintor, com azulejista. Como que a gente pode passar uma dica que seja de confiança pra quem tá ali assistindo a gente. Dica com fundamento técnico por trás, né? Uma dica que realmente vai ajudar a pessoa. Não é só: olha que bonito, gente! O bonito fica muito vago. [...] A gente se especializa para compartilhar boas soluções.”
Os textos aqui publicados não refletem necessariamente a opinião do Grupo Record.