Azulzinho

Como para mim, para ele o Jardim da Infância é passado. Meus longínquos anos de brincadeiras se enevoam em minha mente como a areia dos parquinhos, em que eu mergulhava pás, enchia baldes, fazia desenhos e desenhava sonhos.

Para ele, ainda não, mas a ampulheta já começa a rodar. Ele deixou o uniforme vermelho e branco do maternal no fundo do armário. E passou a usar o azul, referente ao Azulzinho, carinhoso apelido desta unidade escolar.

Também não terá tanta brincadeira na areia, começa a se despedir do baldinho, já não acha tanta graça na motoca gorda de plástico. Se bem que nunca achou...Mas seus olhinhos continuam brilhantes, a se avolumarem sob os cabelos lisos que combinam com seu rosto suave.

Jardim da Infância remete ao Jardim do Éden. Horas mais flexíveis, discursos mais abertos, choros, risos, xixi na calça, para uns mamadeira.

Flores no parquinho, sonhos de menininho, riscando o céu ensolarado da manhã sem destino. Uma abelinha é novidade, também um perigo mortal. Mundo lúdico, prazeroso, acolhedor, saboroso.

Na nova unidade, não vai mais até a classe acompanhado do papai e da mamãe. O tchau é lá no carro. Ele precisa entrar sozinho, subir as escadas, virar a esquerda para encontrar o mesmo alarido infantil que permanece cheio de vida, até impulsionado pelos avanços. Ainda é uma criança. Apenas uma criança maior. 

E quando o vejo dar seus passinhos, com suas perninhas fininhas rumo à aula, percebo que se embrenha na busca de novidades. Já já irão seus dentinhos. Mas enquanto isso, da calçada, caminha para a escola arrastando a mala de rodinhas.

Cumprimenta o porteiro. Abre a mão e dá um soquinho. Quero gritar algo, me calo. Já não posso. Ele não olha para trás, segue em frente. Mundo novo. E finalmente atravessa o portão, para encontrar, do outro lado, um novo jardim.