Queijo, doce de leite e Clarice
Os mineiros estão de quatro por ela. Foi essa a intenção da curadora da exposição La Maison de Clarice, no belíssimo prédio da Academia Mineira de Letras, em Belo Horizonte
Se eu fosse eu|Do R7 e Renata Chiarantano

Clarice nasceu na Ucrânia, veio com 2 anos para o Brasil. Aqui, virou nordestina, depois carioca. E nunca escondeu a “mineirice” que lhe pertencia. Era ucraniana, nordestina, carioca e mineira de coração.
Tudo começou com queijos, doces de leite e conversas com amigos que se transformaram em fiéis escudeiros da escritora. Fernando Sabino, mineiro de O Encontro Marcado, tinha muitos encontros com Clarice. Uma ligação de belos horizontes entre os dois percorreu oceanos.
Cartas Perto do Coração, livro de cartas entre Fernando Sabino e Clarice Lispector, é um dos mais belos livros já escritos e que evidencia a importância do escritor mineiro na vida de Clarice.
Ela também teve intensa ligação com o escritor Otto Lara Resende, que certa vez disse: “Você deve tomar cuidado com Clarice. Não se trata de literatura, mas de bruxaria”.
Se ela se encantou com Minas e os escritores mineiros, a recíproca é latente, mais do que verdadeira. Os mineiros estão de quatro por ela. Foi essa a intenção da curadora da exposição La Maison de Clarice, no belíssimo prédio da Academia Mineira de Letras, em Belo Horizonte.
Guiomar de Grammont trouxe uma Clarice para perto dos mineiros e de todos nós que apreciamos bons queijos, doces de leite e textos profundos. A entrada já é um convite à beleza e à realeza. O cheiro das flores, de que Clarice tanto gostava, exala nas entrelinhas.
A mineirice de observar e descrever a violeta com a sensatez que ela merece. “Ela se esconde para poder entender o próprio segredo.”
Um casarão construído no ano em que Clarice nasceu, em 1920. Clarice está em casa na Academia Mineira de Letras. Ela reina. Papel, caneta, máquina de escrever. O mundo só para ela. Para todos os mineiros e para quem se permitir adentrar no vasto mundo do autoconhecimento.
Na exposição, ela está ao lado de outras duas escritoras francesas: Marguerite Duras e Nathalie Sarraute. Ambas deixaram os países de origem com destino à França e aqui, lado a lado, embarcam nessa viagem juntas. Ambas judias, assim como Clarice. No papel e na pele, o preconceito e o antissemitismo que serviram de inspiração para grandes obras.
Com apoio da Embaixada da França no Brasil, a exposição retrata fotos, troca de cartas e sensações. Você entra ali sabendo que sairá diferente. Mais mineira, mais observadora, mais menina, mais mulher, mais Clarice.
Clarice tinha uma relação de afeto e admiração notória com a França. Traduzia textos em francês e tinha o savoir-faire que lhe ajudava em muitas situações da vida.
Na cozinha, no quarto, na sala, todos os espaços da Maison de Clarice são amplos de criatividade e frases que paralisam: “Sou tão misteriosa que não me entendo”. A tarefa árdua e, ao mesmo tempo, desafiadora é tentar entender essa escritora de traços russos, nordestina, carioca, mineira de alma.
Respirar as flores de Clarice, a França de Marguerite Duras e Nathalie Sarraute, respirar o ar de autoconhecimento, respirar o caminho sem volta. Assim como a violeta, Clarice se escondeu para poder entender o próprio segredo. Tente encontrar o seu. Hora de Claricear. E mineirar.
A exposição La Maison de Clarice é gratuita e está na sede da Academia Mineira de Letras até o dia 14 de outubro.
La Maison de Clarice traça um paralelo entre a vida e a obra de Clarice Lispector e das escritoras contemporâneas Marguerite Duras e Nathalie Sarraute.
"Sou tão misteriosa que não me entendo." Os mistérios de Clarice na sala, na cozinha, no ar que respiramos.
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