Alan Jackson - "When Somebody Loves You"
O nono álbum de uma das maiores vozes da Country Music não foi o maior sucesso de sua carreira, mas deixou sua marca dez anos após a estréia do cantor no mainstream
Toque Toque|LEO VON, do R7
Não é segredo para ninguém a influência musical que tive em casa desde criança do meu pai. Desde o Rock’n Roll e R&B dos anos 50, o som lisérgico da psicodelia dos anos 60 até a Soul Music dos anos 70. Mas é importante lembrar que minha mãe, antes de tudo, é uma fã de música, e claro, músicos. Ela também assistiu à invasão da Beatlemania e acompanhava religiosamente os festivais e programas de TV da Record. Seu preferido era “O Pequeno Mundo de Ronnie Von”, obviamente, mas nos anos 60 era uma criança e uma adolescente, e foi na fase adulta que se apaixonou por um estilo que ainda não era muito popular no Brasil, a Country Music.
Alan Jackson é uma das mais importantes figuras da música Country, desde seu lançamento no mainstream em 1990. Vendeu mais de 75 milhões de discos no mundo inteiro com 15 álbuns e 35 singles chegando ao primeiro lugar na Billboard. Seu estilo, “Neo-Tradicional”, dá ênfase à instrumentação, como a rabeca (como um violino mais rústico), a guitarra pedal steel e solos de guitarra bem característicos tipo “chicken pickin’”, como também na forma de cantar, como os artistas tradicionais das décadas de 40, 50 e 60. Isso tudo totalmente integrado ao Pop Country “moderno” dos anos 90.
Minha mãe sempre tinha no carro algum disco de country que íamos ouvindo quando me levava para a escola. Amava Kenny Rogers, Dolly Parton, Glen Campbell. Lembro como se fosse ontem, era perto do Natal e eu estava de férias. Fomos ao shopping center e na extinta loja de CDs Billbox, naqueles aparelhos de teste com fone de ouvido, escutou pela primeira vez o já consagrado Alan Jackson. O álbum se chamava “When Somebody Loves You” lançado em Novembro de 2000. Pesquei ela conversando com o vendedor, o Silvio:“Como eu nunca escutei esse cara antes? É muito bom isso”! Claro que acabou comprando o disco.
“When Somebody Loves You” foi o 9° lançamento do cantor. A recepção teve pontuações variadas, desde 5 estrelas pela Allmusic até 2 estrelas de cinco pela Rolling Stone e uma avaliação nada lisonjeira da People Magazine que disse: “(o disco) é um desperdício de uma das mais distintivas vozes da country music”. Mas tanto para minha mãe quanto para mim, essa era a primeira vez que estávamos ouvindo Alan Jackson. Era bom demais!
A faixa de abertura, “Meat and Potato Man” foi como se um novo universo tivesse se aberto. A rabeca causando aquele curto suspense suficiente para causar expectativa, a guitarra steel “chorando” uma melodia com fluidez, ligações suaves entre notas, até a voz grave, aveludada, com nuances em agudos de presença agradável, como o abraço de um pai ou de um avô. Essa música se tornou um hino para mim. Fala das coisas simples que um homem simples tem apreço, como uma cerveja gelada, futebol às segundas-feiras, batatas fritas e programas antigos de TV.
A faixa título logo na sequência, me apresentou um lado mais romântico, calmo e bonito do estilo. Ainda moleque gostava de pancadas sonoras, mas essa música falou comigo, em meus primeiros sinais de maturidade.
Era época de férias escolares, e como sempre, íamos para a casa da minha avó no interior de São Paulo, onde eu fingia ser cowboy. Na estrada, apenas minha mãe e eu, porque meu pai teve que ficar e trabalhar. Durante toda a viagem, Alan Jackson no som. Uma tradição que temos até hoje. “Where I Come From” fala de onde ele veio, das tradições simples do interior enquanto conversa com um policial que o parou na estrada. Tema perfeito para quem está à caminho do sítio da avó.
Www.Memory, é uma boa música, mas a letra não é minha favorita. No auge da “bolha da internet”, quando tudo era “.com” e “@seiláoque”, “Www.memória” pede para alguém que está indo embora que, se não escrever uma carta, não telefonar, mas bater a saudade, pode clicar em Www.memory. Mesmo criança sentia aquele arrepio meio “cringeworthy”. O instrumental é excelente, mas nem tudo pode ser perfeito.
Aprendi o que era um Redneck com a música “It’s Alright to be a Redneck”, um termo hora pejorativo, hora abraçado por muitos, que significa “pescoço vermelho”. Alguém que trabalha no sol o dia inteiro e acaba ficando com queimaduras apenas na nuca. Pessoas humildes, sem muita instrução, fiéis à tradições que em alguns casos podem ser consideradas retrógradas e antiquadas. Nesse caso, Alan Jackson abraça o termo e diz que “tudo bem ser um redneck, tudo bem trabalhar no sol o dia inteiro, dirigir uma caminhonete velha e suja, comer frango frito e ter uma namorada chamada Thelma Lou”.
Mas minha música preferida é “Three Minute Positive Not Too Country Up-Tempo Love Song”, uma “música de amor de ritmo rápido positiva não muito country de 3 minutos”, uma crítica à cena musical de Nashville que estava (como sempre) priorizando somente questões comerciais em todos os aspectos. Jackson estava cansado e desiludido (como sempre) com muitas dessas questões e resolveu fazer o clichê dos clichês com essa música. O tempo tem a duração comercial, com tema comercial e não muito country para ficar mais… comercial. O interessante é que a composição segue, com a letra e música, todas as nuances para uma crítica bem feita, delicada e muito eficaz. A instrumentação é algo primoroso.
Posso dizer que Alan Jackson é meu artista country preferido e “When Somebody Loves You”, apesar de não ser o melhor disco de sua carreira é também meu preferido. Foi ele me que abriu esse novo mundo, em que a simplicidade é o mais complexo e complexo é conseguir ser simples. Foi ali que conheci meu guitarrista preferido do gênero, Brent Mason, que gravou se não todos, quase todos os discos de Jackson, além de Brooks and Dunn, George Strait e Shania Twain. E a conclusão mais interessante é que minha mãe, diferentemente do que seria óbvio, foi a maior influência musical que tive no estilo que faço hoje. Yeehaw.
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