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Patricia Lages

Perdão, só que não! Desenrola Brasil não terá perdão de dívidas até R$ 100

Ministro da Fazenda chegou a dizer que dívidas de até R$ 100 seriam "perdoadas", mas negou dias depois por meio de nota

Patricia Lages|Do R7

A prática de recorrer ao crédito sem nenhum planejamento fez da inadimplência um problema extremamente grave no Brasil. Ao contrário do que muitos podem pensar, o alto endividamento do brasileiro está mais ligado ao fato de não saber lidar com dinheiro do que a falta dele. Prova é que, segundo a CNC (Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo), o endividamento atinge 78,3% das famílias, independentemente da renda.

Mas, apesar de não haver soluções mágicas para questões complexas, o Estado brasileiro, por meio de seus governos e desgovernos, insiste em criar medidas imediatistas que, em vez de melhorar a situação dos devedores, podem prejudicá-los ainda mais.

Embora o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, tenha afirmado dias antes do lançamento do Desenrola Brasil que as dívidas de até R$ 100 seriam “perdoadas”, não é isso que o programa propõe. Para remediar — ou como diria a mídia, que mais parece assessoria de imprensa do governo: “Para corrigir a informação imprecisa” —, dias depois, Haddad postou em uma rede social que o programa é “para quem quer limpar seu nome na praça” e poder “conseguir crédito”. O ministro diz que, com nome limpo, as pessoas poderão “financiar uma geladeira nova, fazer o contrato do aluguel, pegar um empréstimo”, e que isso seria “progredir na vida”. 

Primeiro, é preciso esclarecer que só ficarão com o nome limpo as pessoas que tiverem apenas uma dívida bancária inferior a R$ 100, o que é bem improvável, segundo pesquisas. Segundo, caso o devedor não pague essa dívida, ficará com o nome negativado novamente, o que piora sua situação e ainda oferece uma vantagem extra ao credor. Isso porque a negativação do CPF tem um prazo máximo estabelecido por lei de cinco anos, e, ao ficar inadimplente novamente, o prazo começará a contar a partir da nova data de negativação, deixando o nome do devedor “sujo” por mais tempo.


Por exemplo: se uma pessoa teve seu CPF negativado em 2019, ao completar cinco anos, a medida prescreveria, ou seja, o nome ficaria “limpo” em 2024 e, apesar de a dívida ainda ter de ser paga, o CPF do devedor não poderia ser negativado novamente. Porém, com a suspensão da negativação exigida pelo Desenrola Brasil, caso esse devedor não pague nos próximos meses, seu nome será negativado pela mesma dívida por mais cinco anos, isto é, até 2028.

Para fechar, é decepcionante que um ministro de Estado considere que comprar uma geladeira financiada ou fazer um empréstimo seja “progredir na vida”. As taxas de juros praticadas no Brasil, em modalidades como cheque especial e rotativo do cartão de crédito — as mais utilizadas pelos brasileiros —, estão entre as mais altas do mundo. Incentivar o endividamento da uma população sem educação financeira não é contribuir com seu progresso, mas, sim, endossar práticas que só levam as pessoas cada vez mais para o buraco. Se esse é o plano, tem tudo para dar certo.

Os textos aqui publicados não refletem necessariamente a opinião do Grupo Record.

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