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DiFato Tudo Importa

A visão jornalística por trás de uma tragédia: os bastidores da cobertura da queda do avião

A queda do avião da Voepass, a dor de familiares e o trauma para quem assistiu a toda a tragédia.

DiFato Tudo Importa|Dionisio FreitasOpens in new window

Avião que caiu tinha 62 pessoas a bordo
Avião que caiu tinha 62 pessoas a bordo Reprodução/RECORD - 9.8.2024

“Aqui é rota de avião. Fico pensando que vai cair outro avião a todo instante. Não durmo mais“. O medo de Natália Soares é resultado de uma das maiores tragédias da história da aviação civil no Brasil.

Durante três dias vi de perto o caos, o medo e a dor de parentes das vítimas da queda do avião da empresa Voepass e de pessoas que assistiram ao despencar da aeronave em um condomínio da região de Vinhedo, cidade a 75 km do centro de São Paulo.

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Cheguei ao local do acidente, o terreno de uma casa, cerca de uma hora após a queda. Ainda víamos fumaça e a ação dos bombeiros em tentar apagar as chamas. Talvez, pela primeira vez na história, vimos algo assim ser registrado por diferentes ângulos e por centenas de pessoas. O que fez com que a maior parte dos 76 mil habitantes de Vinhedo estivesse tentando também acompanhar de perto o desfecho de algo tão trágico. A cidade estava atônita e assustada.

“Achei que era um helicóptero, mas quando olhei vi o avião, ia cair na minha casa, mas foi pro lado de lá”, repetia Dona Gertrudes, que mora há 300 metros da casa atingida pela aeronave.


Recebi centenas de vídeos, flagrantes de uma cena difícil de digerir. Em parte deles, o desespero de quem ainda tentava se aproximar para encontrar sobreviventes. Infelizmente ninguém saiu com vida. Os registros mais próximos, inclusive, mostram algumas das vítimas que foram lançadas para fora da fuselagem no momento do impacto. Uma imagem que, mesmo com minha experiência em coberturas de diversos tipos de tragédias, não consigo esquecer.

Paralelamente a isso, tentávamos confirmar a quantidade correta de passageiros. Inicialmente falavam em 68 (talvez pela capacidade da aeronave), mas depois, com algumas ligações, veio a confirmação de 62 vítimas.


Pensei, meu Deus, como reportar, ao vivo, para no mínimo 62 famílias que seus parentes se foram de forma tão trágica? Esse é o dever do jornalista: ser técnico, superar a própria emoção e comoção, e contar com cuidado e zelo aquilo que vai gerar dor.

“Ouviu um barulho estranho e viu que o avião ia cair, pegou o celular e ficou desesperada”, conta Eliane Sicari, moradora do condomínio, ao relatar o registro de celular feito pela filha que assistiu à queda pela varanda da casa.


Naquela sexta-feira, tudo parecia ainda muito confuso, com muita dor envolvida. Inclusive, foi difícil dormir. Na minha memória vinham as palavras de medo e o relato de familiares. Famílias inteiras na aeronave, crianças, animais.

No sábado, o número de moradores ao redor estava bem menor, mas o susto ainda era visível. Alguns moradores receberam autorização para voltar para casa. Eles não sabiam ainda o que encontrariam. Nas casas próximas, bastava o barulho de um caminhão para todos aparecerem na janela.

Nesse dia, me tocou o pedido de uma criança, a Joana de 9 anos. ”Tio, diz que foi mentira, que ninguém morreu”. Me calei nessa hora, dei um abraço nela e pedi que orasse para quem estava ali.

Vi viaturas do IML de São Paulo deixando o local com os corpos. Os 62 corpos foram retirados dali. Nomes, histórias, medos. Começava o trabalho de perícia para retirada dos equipamentos que podem ajudar a entender essa tragédia.

Tragédia que ainda deve ter mais capítulos. O Centro de Investigação e Prevenção de Acidentes Aeronáuticos, o CENIPA, tem 30 dias para produzir o laudo preliminar do que pode ter causado a queda do avião, e transcrever e entender a leitura das caixas pretas. Já para as famílias e para quem assistiu a tudo isso ficam meses de dor, de apreensão e de tentar encontrar resiliência para superar tudo isso.

“A questão psicológica dependerá de como a pessoa está se percebendo, caso esteja atrapalhando emocionalmente e socialmente, é interessante buscar ajudar para poder reorganizar os seus pensamentos, assim amenizando o trauma, aprendendo lidar melhor com o momento”, ressalta a psicóloga Patricia Muneron. Creio que todos precisaremos.

Os textos aqui publicados não refletem necessariamente a opinião do Grupo Record.

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