Racismo e pandemia: cenário exige nova postura de influenciadores
Furar o isolamento ou compactuar com violências raciais podem levar ao 'cancelamento' da carreira destes profissionais
Viva a Vida|Hysa Conrado, do R7

“Internet não é terra de ninguém” é o que se fala quando alguém extrapola os limites do bom senso na web. Mas, e quando quem faz isso é um influenciador com milhares ou milhões de seguidores? Recentemente, a coach Luísa Nunes Brasil afirmou para um público de mais de 50 mil pessoas em seu Instagram que é “natural” ter medo de pessoas negras que “parecem criminosas”.
A fala foi considerada racista e ela teve o perfil excluído da rede social. O episódio, que reacendeu o debate sobre o papel dos influenciadores digitais no cenário atual, aconteceu um mês depois de a musa fitness Gabriela Pugliesi ter sido duramente criticada por compartilhar nos stories que furou o isolamento para festejar com os amigos.
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Em tempos de pandemia e violências raciais no centro das discussões, apresentar um posicionamento ou conduta responsável se tornou parte da expectativa de muitos internautas que acompanham youtubers, instagramers e blogueiros.
Produzir conteúdos sem passar em algum momento por esses temas, ou mesmo desrespeitá-los, tem gerado ondas de indignação e ‘cancelamento’. “Os influencers nasceram na lógica da identificação, eles parecem nossos amigos, eles compartilham seu dia a dia conosco, por isso existe a cobrança. O que é positivo, já que somos nós, os seguidores, que legitimamos o trabalho deles”, esclarece Issaaf Karhawi, doutora em Ciências da Comunicação.
Karhawi explica, ainda, que o influenciador é também uma marca e, por assim ser, tem visão, missão e valores. “Pode ser que para aquele influenciador não faça sentido se posicionar dentro da marca que ele construiu, mas que para outro faça. O papel deles é o de ser coerente com o conteúdo que produzem, é o básico que a gente exige nas redes. A Pugliesi não foi rechaçada porque as pessoas estavam nervosas, mas porque ela quebrou um pacto de vida saudável que construiu com seus seguidores”.
Compromisso com a realidade
"Todo influenciador é um formador de opinião", explica Taís Oliveira, mestre e doutoranda em Ciências Humanas e Sociais. A atuação desses profissionais impacta na forma como seus seguidores constroem suas visões de mundo e se propõem a mudanças de hábito.
“Os influencers precisam entender a importância deles nesse sistema de produção de conteúdo, que eles estão lidando com o dia a dia de diversos cidadãos que vão tomar decisões e vão se sentir tocados por aquela mensagem. Eles precisam ter essa percepção da importância deles no contexto social”, afirma Oliveira.
É possível para os influenciadores verem o movimento Black Lives Matter (Vidas Negras Importam) passar e não falarem nada? A resposta do mercado, ao menos, é negativa. “Não dá mais para ficar em silêncio sobre questões importantes para a sociedade, ainda que a posição seja ‘eu não tenho capacidade para opinar sobre tal assunto, mas irei me aprofundar e trazer meu posicionamento’”, afirma Alex Monteiro, um dos sócios da Non Stop, agência de influenciadores digitais que tem nomes como o do humorista e youtuber Whindersson Nunes que, sozinho, reúne mais de 80 milhões de seguidores no Instagram e YouTube.
Uma das tendências seguidas por influenciadores na última semana foi a de ceder espaço em seus perfis para que estudiosos e ativistas de questões raciais no país falassem sobre o tema. Para Monteiro, precisa existir um bom senso tanto do público quanto do influenciador acerca dos assuntos que estão em pauta no momento. Na visão do empresário, a coerência precisa estar alinhada com a produção de conteúdo.
“As redes sociais são a grande causa da polarização dos temas morais. Portanto, é impossível para os influenciadores não se posicionarem. O ambiente deles é a rede, não tem como fugir. Mas essa exigência traz mais uma responsabilidade que é a de saber de fato do que está se falando”, explica.