Procrastinação: por que é tão difícil vencê-la?
De tão comum, adiar o cumprimento de tarefas do dia a dia, responsabilidades e compromissos já faz parte da cultura brasileira
Patricia Lages|Do R7 e Patricia Lages
Você se interessou por este artigo, mas está pensando em salvar para ler depois? Se a resposta é sim, você acaba de entrar para o rol dos procrastinadores!
Basicamente, procrastinação é o adiamento de tarefas, desde as mais simples às mais importantes, sem que haja um motivo real e mesmo sabendo que haverá consequências. No Brasil, a prática é tão comum e aceita que já pode ser considerada parte da cultura. Não é à toa que dizem que brasileiro deixa tudo para a última hora.
Uma pesquisa conduzida em 2012 pela Triad Productivity Solutions – empresa especializada em produtividade – apontou que 97,4% dos entrevistados admitiram adiar o cumprimento e tarefas do dia a dia. As mais citadas foram: exercícios físicos (68%), leitura (64,5%), cuidados com a saúde (52,7%) e planejamento financeiro (46,8%). É curioso, ainda mais nesta época, ver que os tradicionais votos de ano novo “muito dinheiro no bolso, saúde para dar e vender” não são prioridades e têm sido empurradas com a barriga por cerca de metade da população.
A procrastinação traz dois tipos de consequências: as externas, como atrasos na agenda e baixa produtividade, e as internas, como estresse, sentimentos de culpa, vergonha, fracasso e até de incompetência diante de um costume que parece impossível mudar. Isso porque, grande parte dos procrastinadores não consegue quebrar o ciclo apenas seguindo as estratégias que deveriam resolver o problema, como aplicar técnicas de gerenciamento de tempo, buscar motivação e estabelecer recompensas após o cumprimento de uma tarefa.
Embora sejam táticas positivas e, em muitos casos, comprovadamente eficazes, a neurociência explica o motivo de não serem tão efetivas para os procrastinadores.
O que a neurociência diz sobre a procrastinação
Segundo a neurociência, a procrastinação, embora não esteja apoiada em motivos racionais, é uma decisão consciente e intencional com o objetivo de obter recompensas imediatas. Trata-se de um recurso utilizado pelo cérebro quando a realização de uma determinada tarefa é interpretada como uma dor e, portanto, deve ser evitada. Essa espécie de mecanismo de defesa cerebral tenta criar justificativas – ainda que irracionais – para protelar a tarefa que, quanto mais complexa for, mais fácil de ser adiada.
Esse pode ser motivo pelo qual algumas estratégias de produtividade surtem pouco ou nenhum efeito no combate à procrastinação. Ao considerarmos que o adiamento vem de uma decisão intencional, podemos entender que as técnicas de gerenciamento de tempo não são a solução, afinal o problema não é falta de tempo. O mesmo ocorre em relação à motivação e às recompensas.
O procrastinador não está desmotivado, ao contrário, ele sente-se altamente impelido a não fazer. Assim como ele também não está em busca de recompensas, pois evitar a dor da tarefa já é a sua melhor e imediata recompensa. A maneira de vencer problemas, quaisquer que sejam, é atacá-los pela raiz e, no caso da procrastinação, que se origina em fatores emocionais, medidas externas só serão efetivas se as questões internas forem resolvidas primeiro. É preciso decifrar as emoções que desencadeiam a prática e trabalhar de dentro para fora.
Entrando no quarto escuro
Uma criança que tem medo de escuro evitará a todo custo entrar em um ambiente sem luz, ainda que seja o seu quarto, onde ela passa parte do dia brincando tranquilamente. Mas, à noite, mesmo sabendo que é hora de dormir, ela vai dar um jeito de evitar o local. Seu cérebro cria a fantasia de que há alguma ameaça, um monstro, um bicho-papão, um rato, uma barata e sua defesa será adiar essa dor até não poder mais.
Quando não for mais possível adiar, vencida pela insistência dos pais, pela falta de argumentos ou mesmo pelo cansaço, a criança cede, mas não sem fazer aquele drama. Essa experiência é tão traumática que, mesmo depois de entrar, dormir e levantar pela manhã sem ter sofrido qualquer ataque, ao anoitecer novamente, é provável que ela faça tudo de novo. Isso porque, mesmo que suas fantasias não tenham se concretizado, suas emoções foram reais e ela precisa evitar tudo aquilo novamente.
Sendo assim, em alguns casos, a motivação e a oferta de recompensas não resolvem. Afinal, ela já está altamente motivada a evitar o local por um sentimento muito forte, o medo. E sua maior recompensa é sentir-se segura longe dali.
Os adultos procrastinadores agem de forma semelhante, movidos por algo – real ou irreal – que desperta uma forte motivação e ainda oferece recompensa imediata. Uma solução para vencer a procrastinação pode ser a descoberta de quais sentimentos e emoções estão por trás desse comportamento e lidar com a situação sob um ponto de vista racional. Uma vez vencida essa etapa, as estratégias de produtividade e técnicas de gerenciamento de tempo tendem a ser muito mais efetivas.
É importante dizer que a tentação da procrastinação vem para todos, inclusive para aqueles que possuem cargos de alta performance, por isso, é necessário que todos nós estejamos alertas e vigilantes para combatê-la diariamente.
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